Dominada pelo pagodão, playlist viral dá uma mostra das músicas mais ouvidas em Salvador

Nomes pouco conhecidos, muito groove e letras sexualizadas dão o tom das músicas mais ouvidas e compartilhadas em Salvador reunidas em playlist do Spotify.

Que o pagodão é a grande preferência do público baiano, ninguém duvida. A playlist Viral Salvador do Spotify (da semana de 15 a 22 de setembro), no entanto, mostra que o domínio do gênero é imenso e ocupa quase 50% do que a população da capital baiana está ouvindo e compartilhando nas redes sociais. O gênero domina ainda todas as 25 primeiras das 100 músicas listadas. Depois do pagode, as preferências são o arrocha e piseiro, muito atrás, com 15 e 8  faixas entre as 100, respectivamente. O Axé, que já foi dominante, segue pouco relevante, aparecendo, com apenas cinco faixas.

A lista diz muito além do que parece até óbvio, mesmo para quem circula pela cidade. Ao contrário do que pode se pensar, as pessoas em Salvador estão muito ligadas a uma cena mais nova, com nomes pouco midiáticos, com produções menos caprichadas e com letras ainda mais picantes e sexualizadas do que em outros tempos. 

Nomes famosos Brasil afora pouco aparecem na lista, bem como artistas baianos muito badalados, que estão presentes de forma tímida. Nada de Anitta, Luísa Sonza, Gloria Groove, Iza ou Gusttavo Lima. Eles não aparecem nem entre as 100 mais. Ludmilla se faz presente com uma música na 71ª posição.  Os baianos mais famosos, como Ivete Sangalo, Léo Santana, Psirico, Xanddy Harmonia e Bell Marques, surgem discretamente, com uma faixa cada, sendo Léo Santana o mais bem posicionado, na 33ª posição.

Novidades

A enxurrada de novos artistas denota um cenário artístico fértil, que se renova a todo momento, sempre com novidades, tanto de nomes, quanto de estilos. Como é o caso da bregadeira, um misto de arrocha, pisadinha, pagodão e batidas eletrônicas. Essa playlist mostra um cenário musical que atravessa barreiras formais, gravadoras, estúdios com alta tecnologia, grandes empresários ou espaço em mídia.

Entre as 20 mais tocadas, por exemplo, estão muitos nomes novos e pouco conhecidos para quem não está inserido esses nichos. É o caso de Dan Ferreira, Oh Original, Fala com o Trem, Papo de Cria e Tinho Oh Drama. Neste “20 mais” aparecem também algumas revelações bem recentes do pagodão baiano, como Oh Polêmico e Oh Kanalha, e apenas dois nomes mais conhecidos, Igor Kannário e Robyssão.

Nessa playlist Viral Salvador não há também artistas com muitos sucessos. Ela mostra uma grande pulverização de nomes, poucos deles com mais de uma música entre as 100. Apesar disso, há uma concentração de gêneros e estilos e uma diversidade aquém do que é produzido na capital baiana. O pagode é hegemônico, com 49 faixas, além dele, ritmos e gêneros que trafegam por um ambiente similar, como arrocha, piseiro, bregadeira, forró e sertanejo aparecem com 31 músicas. Todo o restante, axé music, funk, trap, rap, sampa, pop, reggae e a chamada música brasileira contemporênea, com os 20% que sobram. Sem falar nos que nem aparecem.

Merecem menção aqui alguns nomes da cena independente baiana, especialmente aqueles que aparecem com duas músicas, como a banda de reggae Adão Negro (com “Metal Reggae” e “Adão Negro”), e Rachel Reis, que aparece num “feat.” com Gilsons em “Bateu” e também com seu hit “Motinha”. Desse universo também aparece na lista o nome de Pedro Pondé, com “Imprevisível”, parceria com Freelion, e BaianaSystem em uma parceria também com os Gilsons (“Presente”).

Poucas mulheres

Chama atenção negativamente a grande concentração de artistas masculinos. Das 100 músicas mais tocadas/compartilhadas, apenas 10 trazem mulheres à frente, além de algumas outras que estão presente como cantoras convidadas em “feats’.

A cantora sergipana Symone Morena é a mais bem colocada, aparecendo no 31º lugar. As outras artistas femininas são A Dama (49º), Taty Girl (59º), Ludmilla (71º), Gabi Saiury (72º), Marília Tavares (77º), Priscilla Senna (79º), Anna Catarina (87º), Rachel Reis (99º) e Ju Moura (100º). Em feats, aparecem Ivete Sangalo com Xanddy Harmonia (50º), Ludmilla com La Furia (80º) e Rachel Reis com os Gilsons (84º), entre outras.

Evidente que há vários outros vocais femininos, presentes especialmente nas quebradeiras, com backing vocals cumprindo o papel das mulheres nos diálogos sexualizados. Esse é, aliás, um ponto que chama muita atenção. O dominío do pagodão revela uma cena em plena ebulição, com forte presença nos paredões das periferias e quebradas da capital baiana.

São músicas com produção e arranjos básicos, que dão ênfase a criativas percussões,  aliadas a tecladinhos simplórios e repetitivos. Os vocais alternam vozes masculinas, e, eventualmente, femininas, especialmente para ilustrar falas sexualizadas do ponto de vista da mulher.

Os títulos das músicas já indicam os sugestivos temas abordados: “Relaxa e Goza”, “Bloco da Putaria”, “Gemido 2.0”, “de 4”, “Bandido Mau”, e “Trafica Xereca”. Mas são as letras que trazem o teor libidinoso de forma escancarada, sem nenhum constragimento no uso de palavras e expressões explícitas. Versos como “Passa, passa essa xereca”, “Reaxa que eu vou sentar/ Bota bota quando eu pedir/ Calma calma vai devagar/ Mas tira quando eu mandar”, “Levanta essa bundona, Fica de quatrão e toma toma toma”, “Relaxa com a tcheca em cima da vara”, “De quatro, bota tudo, vai caralho, empurra tudo/ Joga xereca pro malvadão”.

Ou ainda, “Fica de quatro, amor/ Puxa o cabelo dela/ Toma sua piranha/ Toma sua cadela/ Dá tapa na bunda dela”, “Nunca aceite homem duro/ No cacete duro”, “Vou te machucar de frente/ Te machucar de costas/ Fazer daquele jeito que você gosta/ Senta na bola com pelo”, “Vou cavucar sua buceta do jeitinho que você gosta/ Tu vai gemer de tesão na minha piroca”, “Eu amo essa filha da puta, essa filha da puta me ama/ Que porra nenhuma, meu pau que te ama”.

Viral é um recorte

Playlists como essa não dizem tudo sobre o que as pessoas ouvem. É um recorte de um período em Salvador de uma plataforma específica, que é a mais utilizada, mas que também é mais focada em um público consumidor jovem. Não inclui outras formas de audição de música, desde os mais tradicionais, como rádio, até outras plataformas populares, como YouTube, Deezer, entre outras.

Essa playlist viral se caracteriza também não apenas pelas músicas mais ouvidas. O Spotify contabiliza a partir dos compartilhamentos da música nas redes, quais tiveram links postados no stories ou feed do Instagram, no Twitter ou no Facebook, por exemplo. 

Um recorte específico que, se não dá a noção exata do que a população de Salvador está ouvindo neste momento, faz um resumo atual do que trafega nas redes, principal espaço de  consumo de música na atualidade. Oferece também um retrato de como o soteropolitano consome sua própria cultura, já que a maior parte dos artistas listados são de Salvador e região Metropolitana. Muitos podem questionar a qualidade e a diversidade, mas isso é outro papo.

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