Marcela Bellas

Entrevista: Marcela Bellas se encontra na batida do bolero

Com uma longa trajetória na música soteropolitana, a cantora e compositora Marcela Bellas acabou de lançar seu terceiro álbum solo, ‘Beat Bolero’. Solo, já que ela mantem alguns outros projetos na ativa, como o infantil Playgrude. Foi com ‘Beat Bolero’,  que ela diz ter se encontrado, acho seu lugar de conforto. É sobre isso e sobre a composição do trabalho, a produção, a cargo de Silvio de Carvalho, que ela fala nessa entrevista.

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Marcela Bellas

Quem: Marcela Bellas
O Que: Disco ‘Beat Bolero’
Formato: Digital (por enquanto)
Onde: plataformas digitais (Youtube, Spotify e Deezer)
Por quem: Independente
Preço: Audição gratuita

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– Gostaria que você contasse como foi a concepção do disco. Há um conceito nele?

Marcela Bellas – Com certeza, esse álbum nasceu desse momento. Eu lancei o “Bar de Bira”, que tinha no ‘Chega de Chorar de Amor’, em 2014, e desde sempre o bolero é um estilo que está presente em todos os meus álbuns. Desde do ‘Será que Caetano Vai Gostar’, que já tinha “Bacana” enfim, até mesmo no Undergrude, nos projetos paralelos. Porque tudo de alguma forma é bolero também, ele cabe dentro de tudo, ele é essa música mântrica, latina, marítima, caribenha, então, cabe isso. Para além disso, tem a coisa do romance também, do drama, que tem tudo a ver comigo, com a minha música. Eu sempre trabalhei de alguma forma isso e eu sempre compondo muito, sempre com músicas novas, fiquei pensando que tinha um álbum pronto, musicalmente, com as composições. Esse álbum tem dez faixas, dessas dez, nove são parcerias minhas com Helson (Hart). A gente estava produzindo muito e eu queria muito fazer um álbum de boleros, por conta de todos esses boleros que a gente já vinha feito. Na verdade a coisa nasce assim.

– Como foi o processo de composição, produção e gravação do álbum?

Marcela Bellas – Essas músicas nasciam pra mim dessa forma, eu ouvia boleros, eu ouvia um bolero rock, eu ouvia um bolero bossa, mas sempre nesse mesmo lugar, nessa mesma célula. É como se fosse o mar de alguma forma pra mim ali, tem a questão do arrocha, tem a questão do romance, como eu já falei. As músicas iam nascendo disso, dessa coisa que eu tenho de falar de amor. Quanto a produção, eu já tinha fechado o álbum e as músicas e tudo, mas eu não queria produzir. Embora esteja com home-estúdio, o infantil mesmo eu já venho produzindo há algum tempo. Lancei alguns depois do álbum, lancei single ano passado, lancei um monte de singles, então a minha ideia era já tendo o álbum fechado, lançar. Eu tinha essa vontade de fazer um álbum de boleros, mas não boleros cubanos daquela forma tradicional, mas de um jeito mais baiano, um bolero já mais arrocha, mais eletrônico. Queria fazer com um parceiro, com alguém. Não vinha pensando num disco com uma grande produção, cheio de músicas e tudo, porque o disco foi feito de uma forma totalmente independente e o conceito dele era muito claro pra mim. Eu precisava de alguém que pudesse entender isso e colocar pra fora. E foi aí que eu escolhi Silvio de Carvalho que é um músico eu já admiro há muito tempo, já acompanho a Tabuleiro Musiquim, a Suinga, e sempre gostei dele, das composições dele, da guitarra, da voz dele, de tudo. Então, para além dele ser um músico, acho que ele é um artista também, era alguém que estava nesse lugar como eu, nesse lugar de que produzia, mas ao mesmo tempo era o artista. Sabia muito bem o que é cantar, sabia muito bem o que é compor. Achei que ele poderia ser essa pessoa e foi imediatamente. A gente se encontrou na praia. Eu estava pensando isso, que não queria produzir, que queria alguém pra produzir pra mim, já tinha produzido muito com o Tadeu (Mascarenhas), com o Rovilson (Pascoal), em São Paulo, com (Daniel) Cohen, também em São Paulo. São parceiros meus que a gente está sempre produzindo, lançando singles. Mas esse álbum pra mim tinha que ser com um produtor baiano, que tivesse essas referências do rock, mas também do axé music, do arrocha, da vivência da Ilha de Itaparica, que cantasse comigo. Pra mim tinha que ter tudo isso e Silvio era essa pessoa. No final, ficou exatamente assim como eu imaginei que ficaria, eu sou completamente satisfeita com a produção e com a gravação desse álbum. O processo de gravação foi feito em home-estúdio mesmo, a maior parte no home-estúdio dele, eu levava coisas daqui, levava as ideias. As ideias de arranjo foram todas discutidas entre nós dois. Foi tudo muito feito dessa forma. Uma troca minha com ele. E a única participação do disco, além de Silvio é Juliana Sinimbú, que é uma cantora do Pará. Ela é minha parceira de um tempo, a gente já fez uma turnê pelo Brasil juntas pela Natura no lançamento do próprio ‘Chega de Chorar de Amor’. A gente já tem uma parceria aí grande e eu convidei ela pra fazer a faixa ainda de Las Mardita comigo, que é uma faixa que fala da mulher latina, nordestina, da mulher independente. Eu chamei ela pra fazer isso comigo porque tinha que ter outras mulheres. Se eu pudesse seriam muitas mulheres. Na verdade, o ‘Beat Bolero’ como álbum, ele só está começando.

– Quais foram as principais influências durante esse processo de criação?

Marcela Bellas – Desde o “Bar de Bira” eu comecei a pensar a música, a minha forma de fazer música sempre ligada ao audiovisual, que já era uma coisa que eu queria desde sempre. Música pra mim é cinema, mas isso quando se trata de realização precisa de muito investimento. Então, o investimento é complicado. Hoje, com o home-estúdio eu consigo ter uma independência na parte musical. Posso gravar a música, como eu já lancei vários singles que eu produzi tudo. Eu compus, eu gravei, eu mixei, eu masterizei, eu lancei, eu distribuí, eu fiz tudo. Hoje nessa parte da música, a gente pode ser independente, mas pra mim a música teria que ter uma coisa sempre audiovisual, só a parte musical já não me satisfaz. Existe aí o projeto do ‘Beat Bolero’ que ele se torne um filme, do início ao fim. Ele realmente é um álbum, ele tem uma ordem, tem uma uma coisa que amarra ele, é redondo, conta uma história, existe esse roteiro. Esse roteiro foi feito por Fernanda Beling, que é uma atriz daqui de Salvador, que eu admiro muito e que gosta muito também do universo do bolero. Que o bolero não é só um estilo musical, tem todo o universo por trás, um jeito de vestir, uma cultura por trás. A ideia é que esse álbum se torne um filme.

– Em tempos sem ficha técnica disponível, o disco contou com quem na produção, arranjos, ou mesmo em participações?

Marcela Bellas – A ficha técnica é essa. Eu, Silvio (de Carvalho) e Juliana (Simimbú). Os arranjos, como eu te disse, foram feitos assim, as próprias músicas já pedem o arranjo. A música quando surge já nasce com a imagem muito pronta, pelo menos pra mim, é tudo muito claro. A própria canção já diz o que quer. O que que ela quer e o que ela precisa, quais são os instrumentos, qual a sonoridade, pra mim já vem muito isso. A gente trocou muito isso e e as coisas nasciam assim.

“Acho que nesse álbum consegui chegar num lugar que me representa, estou totalmente confortável nele”

– Como ele está sendo lançado e como encontrá-lo?

Marcela Bellas – Ele pode ser encontrado em todas plataformas digitais. Desde de lojas até as próprias Spotify, Deezer, YouTube, enfim. Hoje realmente a as outras formas de mídia, como CD, e essas coisas, eu não pretendo lançar dessa forma, principalmente porque exige um investimento e não acredito no retorno. Acho que ninguém mais ouve disco, eu tenho um monte de CD aqui, quando eu pergunto as pessoas se o som do carro delas tem CD, se elas ainda tem algum aparelho em casa que roda a CD, elas nem tem mais aparelho que roda CD. Então é digitalmente mesmo, distribuir de forma digital.

– Gostaria que fizesse uma análise da sua evolução musical desde o início da carreira até este disco.

Marcela Bellas – Eu comecei com meu primeiro EP, que lancei aos 22 anos, já com músicas minhas. Era um trabalho independente, já era um trabalho produzido em parceria com o Tadeu (Mascarenhas). Acho que de lá pra cá eu fiz muitos álbuns, eu aprendi muito, não só em composição, não só na produção musical, mas o que eu acho que ‘Beat Bolero’ tem de muito forte são as composições que chegaram num nível pra mim desde o Playgrude. No Playgrude eu cheguei num lugar onde eu pude me considerar pra mim mesma uma compositora. Dizer assim: “hoje eu sou uma compositora”. Antes eu estava experimentando, estava querendo descobrir, querendo saber. Hoje eu sinto que eu estou pronta pra falar sobre qualquer assunto dentro da minha música. Isso é uma grande evolução, isso é uma construção. É um exercício diário compor e a produção musical também é um aprendizado, é uma coisa que você aprende fazendo, realizando. Eu pude gravar vários discos, aprender muitíssimo com eles todos, com Tadeu, com Rovilson, com Silvio. Ele fala que aprendeu muito com esse trabalho e todo trabalho que a gente faz, a gente aprende muito, mas esse trabalho realmente ensinou como nenhum outro, porque ele foi um mergulho dentro de nós mesmos e até por ter só nós. A dimensão daquilo, a força daquilo é algo muito verdadeiro e muito puro, sem sem muitas interferências. Eu sinto que ele é puro, traz essa espiritualidade. Para além disso, como cantora, hoje eu tenho um domínio da minha voz, que eu aos 22 anos não tinha. Acho também que esse trabalho como cantora é um trabalho maduríssimo e acho que ainda tem muita coisa bacana pra vim pela frente com o ‘Beat Bolero’ e acho que ainda tenho muita coisa pra amadurecer, mas sinto nele uma força imensa. O retorno que tenho das pessoas. A gente sente que é nosso, mas a gente não fala, porque é nosso, mas aí vem alguém e diz “eu senti a mesma coisa”. Eu sentia essa espiritualidade, esse amor. Nesse caminho que eu percebo cada vez melhor a minha música, em termos de composição e acho que os arranjos também. Acho que eu consegui chegar num lugar que é muito meu também. Porque eu estava experimentando muito nos outros discos, eu estava experimentando muitos lugares. Acho que nesse álbum consegui chegar num lugar que me representa, estou totalmente confortável nele. Eu sou muito feliz com esse disco.

– Porque em tempos de streaming ainda lançar um álbum?

Marcela Bellas – Como compositora é uma coisa que não tenho muito o que evitar, eu já tenho outros álbuns prontos. A música nasce de um processo, um processo que é todo dela, que tem começo, tem meio e tem fim. Então ela vai criando mesmo o álbum, ele se faz um álbum. Eu não decidi lançar um álbum, eu fiz um álbum e por isso eu vou lançar. É isso que acontece. Assim como eu fiz o ‘Beat Bolero’, eu já fiz outros álbuns. Como te falei, realmente, eu crio, eu vivo música, eu gravo. Eu preciso disso. Para além de um mercado ou qualquer outra coisa, tem a minha necessidade quanto artista. Ele se fez um álbum. Ele poderia ter 13 músicas, a gente tirou 3 pra lançar depois como single, pra não ficar tão grande. É álbum mesmo, não tem jeito.

– Quais os planos para tornar este trabalho mais visível diante de tanta coisa sendo produzida?

Marcela Bellas – Isso realmente é uma pergunta muito difícil. É aquela coisa, a gente faz o que pode, principalmente na música independente. Eu sou um ser humano só e eu todos os dias penso o que que eu vou fazer pela minha música hoje? Todos os dias eu faço, mas nem fazendo tudo que eu sou capaz de fazer, fazer planos, eu vou conseguir tornar isso visível como deveria. É uma coisa mesmo de fazer, de investir. Hoje em dia, tudo é muito investimento. Sem grana, num rola você fazer se tornar visível. Não rola porque até uma foto que você coloca no Instagram ela só vai se fazer visível se o algoritmo quiser e pra isso depende também de impulsionamento. Se você botar legenda, você vai ter que impulsionar, se não ninguém vai ver. Hoje em dia tudo é muito investimento. Eu faço investimento que eu posso fazer como artista. Passo a passo e não desisto nunca. Acho que ‘Beat Bolero’ tem muita coisa ainda pra render. As músicas entraram nas plataformas digitais e agora a gente vai fazer com que essas músicas se tornem outras coisas para além da música. Vamos esperar que ele vire o filme lindo que ele tem com o roteiro escrito, que isso sim seria muito bacana e a gente vai tentar através de leis de incentivos e tal. Fazer todo o caminho que o artista independente tem pra fazer. Esperar parcerias… Continuar tentando fazer visível. Mas a partir daí, vamos ver o que acontece. Estamos nesse momento também de pandemia, aí se questionar, porque lançar um disco em plena pandemia?, Por que eu também não sei que vai pra onde irei depois da pandemia, nem quando, nem antes, nem durante e nem depois da pandemia. E as músicas não param de surgir, tem que lançar, tem que botar no mundo, tem que rodar.

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