Você é daqueles que acha que não existem boas novidades na música brasileira? Primeiro, desligue o rádio e a TV, neles você não vai encontrar, nem nos cadernos de cultura dos principais jornais. Pelo menos normalmente não. Lenine? Zeca Baleiro? Ana Carolina? Simoninha? Jorge Vercilo? Esqueça. A nova música brasileira atende por outros nomes, mais ousados, mais abertos a novidades, mais inventivos, menos “referencistas”? e, infelizmente, mais desconhecidos.
Essa tal nova música brasileira não é necessariamente uma continuidade da tradicional MPB. O formato baseado em canções no violão aliadas à letras poéticas normalmente falando de relacionamento amorosos foi herdado por nove entre dez artistas de uma MPB “nova”? que hoje infesta rádios e atendem ao público pseudo-exigente da classe AB. Artistas que fazem as mesmas coisas de seus antecessores, apenas reinterpretando as fórmulas de nomes como Caetano Veloso, Djavan, Elis Regina e alguns outros medalhões, sem trazer novas idéias.
A que se trata aqui é outra nova música popular brasileira, que capta sonoridades de nomes consagrados ou não da MPB, em especial Jorge Ben, Luiz Melodia, Mutantes, Novos Baianos, Gerson King Combo, Walter Franco e outros malditos. Além de sonoridades nordestinas e influências bastante diversas de música estrangeira, como Funk, Rock, Rap, Música Eletrônica, entre outros. Eles mantêm a riqueza poética e melódica que consagrou a MPB, mas trazem frescor e, agora sim, novas idéias para a música feita no Brasil.
Se você ainda não se deu ao trabalho de procurar, procure. O resultado pode e deve te surpreender. Um mundo paralelo, de diversos artistas produzindo discos, fazendo shows e criando uma nova música brasileira de verdade se expande por diversas cidades brasileiras. Sem a estrutura das grandes gravadoras, sem a divulgação através de propinas que move emissoras de rádio e TVs e sem os grandes cifrões de marketing, estes nomes vêm se movendo em ambientes paralelos aos mais tradicionais. Selos, festivais e eventos diversos, Internet e uma mídia mais compromissada com cultura do que com o mercado formam este universo alternativo ao tradicional.
Mas de quem esse cara está falando?
Brasil afora se ouve novos nomes revelando essa música nova, com cara e sotaque brasileiro, sem copiar ninguém e trazendo na bagagem de sons perdidos pelo mundo. O eixo Recife/ Olinda desponta como um dos pólos dessas produções. Fora os consagrados e co-responsáveis por essa nova cara da MPB, Chico Science, Nação Zumbi, Mundo Livre S/A e Otto, é dele que vêm nomes como Cordel do Fogo Encantado, Mombojó, Eddie, DJ Dolores e Junio Barreto, entre outros. Temperos diversos para criar uma sonoridade que não é música regional, não é música eletrônica, não é rock. É música brasileira nova.
Dj Dolores acaba de lançar com seu novo projeto, Aparelhagem, um trabalho que traz os ritmos paraenses, o brega e o carimbó, mesclados com elementos dos ritmos pernambucanos e música eletrônica. A Mombojó reúne Tom Jobim, Jorge Ben, Stereolab, Bossa Nova, Samba e cria um som particular. A Eddie, uma ex-banda punk, que mergulhou na sonoridade de sua terra natal, Olinda e extraiu uma miscelânea de sons, traduzindo a atmosfera da cidade em dub, frevo, samba e rock. Junio Barreto, residente em São Paulo, que lançou ano passado um espetacular disco onde coloca um pé na tecnologia e o outro no terreiro, com uma combinação de canções e letras que já vem chamando atenção de intérpretes como Maria Rita e Gal Costa. E o Cordel do Fogo Encantado com sua forte poética nordestina e percussiva.
Na Bahia, um dos nomes que mostra esse frescor criativo é Ronei Jorge e sua banda Ladrões de Bicicleta. Eles fazem música brasileira de alta qualidade, com um cuidadoso trabalho de composição, letras e arranjos e um passeio por lados menos óbvios da música brasileira, com pitada de jazz e uma base rock´n´roll. Também da Bahia destaca-se a tara_code, uma dupla que produz uma música não-comercial, repleta de elementos, que vão de ritmos do Nordeste a rock e trip hop, e resulta num trabalho rico e bastante particular com sonoridade inovadora, experimentações e forte carga poética.
Em várias outras cidades nordestinas essa nova música ganha respaldo. De Alagoas, o cantor Wado aparece como um dos principais nomes. Residente no eixo Rio-São Paulo e com três discos lançados, ele faz uma música de personalidade com referências a sons do Clube da Esquina, Jorge Ben, black music brasileira e rock. Alguns outros trazem um flerte mais claro com a música eletrônica. Como é o caso de Chico Correa & Eletronic Band, da Paraíba; Lado 2 Estéreo, do Piauí, e Sonic Jr., de Alagoas, que utilizam elementos da música nordestina e reprocessam através de computadores, samples e loops.
No universo do rock nacional também aparecem diversos artistas trazendo uma carga brasileira além dos resquícios dos sons de Nova Iorque e Londres. Se o Los Hermanos já mostra isso, com seu rock-samba, gente como Nervoso e Luísa Mandou um Beijo, do Rio de Janeiro, Frank Jorge, do Rio Grande do Sul, Cidadão Instigado, do Ceará; Numismata, de São Paulo, temperam com referências que passam por Jovem Guarda, Bossa-Nova, Samba e outros elementos aliados à guitarra, baixo e bateria. Nesse rápido panorama, outras dezenas de nomes não foram citados, numa das mostras de que novidade é o que não falta, basta sintonizar outras fontes. O novo? Sempre vem.