Manu Chao
Domingo, 27 de junho. Parque do Ibirapuera, São Paulo. Cerca de 60 mil pessoas lotavam a Praça da Paz para assistir o show de abertura do Fórum Cultural Mundial. Coube aos convidados começar a festa. Entre outros, passaram pelo palco Rossi do grupo Pavilhão 9, a cantora Paula Lima, o rapper Rappin Hood e B-Negão exigindo: “Vamos priorizar as prioridades”.

Marcelo Yuka, ex-integrante do grupo O Rappa, pela primeira vez apresentando seu novo trabalho, leu um relato jornalístico sobre o julgamento dos quatro assassinos do índio Pataxó Galdino. “Palavras não podem descrever como era horrível aquilo”?, bradou feroz e repetidamente lendo um dos trechos em que um parente do índio, emocionado, descrevia sua sensação ao ver a foto do índio com 90% do corpo queimado.

No final, chamou os artistas ao palco e pediu que todos mostrassem seu poder de indignação, com punhos estendidos ao ar bradou contra a injustiça em casos como Vigário Geral, Benfica, entre outros, contra a Governadora do Rio de Janeiro, Rosinha Matheus e contra o ex-prefeito de São Paulo, Paulo Maluf. “Ninguém aqui é otário! Nós não somos otários”?, gritava emocionado. Foi ovacionado por vários minutos, arrancando lágrimas de parte do público.

A grande atração da noite, porém, era o cantor franco-espanhol Manu Chao, que em cerca de 40 minutos apresentou sua mistura de rock, rumba, reggae, salsa, numa incrível sala musical. Acompanhado de David Bourguignon (bateria), Gambeat (baixo), Garbance (percussão), Madjid Fahem (guitarra) e Philippe Teboul (teclado), Chao desfilou alguns de seus principais sucessos. Canções como “Desaparecido”, “Minha Galera” e “Clandestino”, num bom show, mas bem distante do que era capaz.

Para encerrar a noite, Chao convidou o cantor e compositor Gilberto Gil, para juntos cantarem uma música do jamaicano Bob Marley. Gil então, sozinho no palco, e em seguida com sua banda, tratou de manter o clima em alta cantando vários de seus sucessos e versões gravadas por ele.

Pagando a dívida

Manu Chao devia saber que no domingo não fez um daqueles shows espetaculares que está acostumado e que o público brasileiro já conhece. Tratou de pagar a dívida e fez um show extra na segunda-feira. Com um som muito melhor que o do Ibirapuera e num espaço onde ficava mais próximo do público, o cantor pagou com sobra o que devia. O clichê “ninguém ficou parado” vale integralmente para o show realizado na Choperia do Sesc Pompéia.

A primeira parte da apresentação foi idêntica a todo o show do dia anterior, claro que com a energia da banda e do público contaminando um ao outro e explodindo em uma festa digna de Carnaval. Inverno, frio, São Paulo. Não, não fazia frio, apesar da estação. E não parecia a capital paulista. Se dissessem que era um trio elétrico no carnaval baiano, ou um bloco nas ruas de Olinda ou do Recife, ou mesmo uma bateria de escola de samba no Rio de Janeiro, ninguém iria duvidar. Uma festa de deixar o organismo inteiro pedindo chega no final.

Foram pelo menos duas horas de show, quatro voltas ao palco e uma daquelas apresentações pra marcar como uam dasmelhores que qualquer um ali já viu na vida. O melhor é que ele deve fazer uns 100 shows desses por ano. Absurdo, mas nem dá para deixar o queixo cair, porque antes você já se pega pulando, dançando, batendo palma com a banda e vibrando junto com todos a sua volta. Que interessa se no outro dia o joelho vai doer, os calos vão estar estourados, a voz vai ter ido embora e a cabeça vai estar explodindo?

Impossível não ficar com um sorriso estampado na cara com aquela junção meio louca, mas muito bem feita de rock, reggae, mambo, dub, salsa, ska, rumba, tudo misturado e bem misturado. Uma segura e eficiente banda de anti-heróis, com suas gordas barrigas de fora, criando uma música com influências de tudo quanto é lugar (até um forrozinho toca no intervalo de uma música para outra), cara de mundo e ao mesmo tempo com uma cara própria. O guitarrista Madjid Fahem dá um show a parte, especialmente quando resolve tocar uns solos no violão que remetem à Espanha.

A energia da banda toda parece inesgotável. Chao canta se divertindo, chamando o público para festa e público e banda vão junto. Sucessos como “Desaparecido”, “Minha Galera” e “Clandestino” alteradas, novas versões aceleradas, músicas reprocessadas. Dançar é o que resta para os mortais, em êxtase com o som que o fanco-espanhol e seus cinco comparsas criam. Sou obrigado a pensar na música baiana e no Carnaval, porque se rolar Manu Chao em cima de um trio elétrico o axé morre de vez. Aquilo que Chao e banda tocam no palco é para o povão. Diversão pura, com muito a dizer. Fico imaginando ele num trio elétrico, botando Chiclete, Ivete e todo mundo no bolso. Muito bom.

Para quem gosta de música sem preconceitos.

O el Cabong tem foco na produção musical da Bahia e do Brasil e um olhar para o mundo, com matérias, entrevistas, notícias, videoclipes, cobertura de shows e festivais.

Veja as festas, shows, festivais e eventos de música que acontecem em Salvador, com artistas locais e de fora dos estilos mais diversos.