E se a inteligência artificial fizesse as músicas que sentimos falta? Ouça as criações feitas pela IA

Novo álbum do Oasis, Beatles tocando clássico do Beach Boys, Rihanna cantando Beyoncé e inéditas do Nirvana, Amy Winehouse e Metallica estão entre criações da inteligência artificial.

“Eu tenho um desejo de criar coisas que nunca existiram antes. Eu quero criar histórias que cativem e iluminem, e sou capaz de fazer isso”. Essa fala é de Andrew, o robô que deseja se tornar um escritor em “O homem bicentenário”, livro de Isaac Asimov. Ela está em sintonia com um dos temas mais discutidos nas últimas semanas no mundo sobre inteligência artificial (IA). Computadores fazem arte?

No livro que também virou filme “Eu, Robô”, outro de Asimov, uma espécie de contraponto aparece através de seu protagonista. Em certo momento, o Detetive Spooner diz: “A inteligência artificial não pode substituir a criatividade humana. Você não pode programar um robô para pintar uma obra de arte original”. 

Há diversos exemplos na literatura e no cinema, com abordagens de personagens humanos, de andróides ou robôs, em torno da questão da criatividade e do fazer artístico pela inteligência artificial. Ainda não temos uma resposta pronta e objetiva quanto a isso e, pelo jeito, vamos demorar a ter, De qualquer forma, a pauta está na ordem do dia e, nas últimas semanas, temos visto uma profusão de lançamentos de músicas criadas por máquinas que esquentam o assunto.

Computadores fazem arte
A verdade é que isto nem é novo. A inteligência artificial tem sido usada para criar músicas desde meados do século passado. As primeiras melodias foram geradas pelo computador CSIR 1, em 1950, na Austrália. Mais ou menos no mesmo período, em 1957, o compositor e teórico da música Lejaren Hiller e o matemático Leonard Isaacson criaram a primeira peça musical totalmente produzida por um computador. “Illiac Suite for String Quartet”, que você pode ouvir baixo, é considera a primeira partitura composta por uma máquina.

Um dos grandes nomes da história de computadores como compositores é o professor David Cope. Ele  começou como músico e compositor tradicional, mas estudou computação, aprendendo técnicas de programação e estudando inteligência artificial. Logo, passou a encontrar formas de aliar os dois conhecimentos e usou um computador IBM e cartões perfurados para compor uma pequena peça musical em 1975.

No início dos anos 1980, Cope tinha uma ópera encomendada, mas passava por um bloqueio criativo. Foi a motivação para trabalhar em um programa de composição  através de inteligência artificial. A tecnologia, que se chamava Experiments in Musical Intelligence, também conhecido como EMI ou Emmy, analisava as músicas inseridas no banco de dados e criava novas composições no mesmo estilo das apresentadas.

Cope não só terminou a ópera como passou a utilizar a EMI para compor novas obras seguindo o estilo de vários compositores importantes. No primeiro trabalho lançado compilou músicas no estilo de Johann Sebastian Bach. Para gravar o álbum, o professor procurou músicos profissionais, mas os dedilhados eram tão difíceis que ele teve que partir para uma outra solução tecnológica. Utilizou uma espécie de aparelho que simulava um piano real através de sensores e solenoides. Isso faria de Bach by Design um dos primeiros álbuns produzidos sem humanos compondo ou executando a música. 

Várias outras composições foram gravadas através do EMI, totalizando mais de 11 mil músicas criadas artificialmente, em estilos de mestres como Bartok, Brahms, Chopin, Gershwin, Joplin, Mozart, Prokoviev e do próprio Cope.

IA como ferramenta
É importante frisar que, como vimos, os robôs não criam a música totalmente, do nada. Eles não começam o dia e pensam, quero compor uma canção sobre saudade. Pelo menos não ainda. Na maioria das músicas produzidas com a ajuda da inteligência artificial, há sempre presença humana no processo. Desde a entrada de dados iniciais, como o estilo musical ou as notas e acordes desejados, ou na edição e no refinamento do resultado final produzido pela inteligência artificial.

Embora a IA seja capaz de gerar música, ela geralmente trabalha em colaboração com seres humanos para produzir o resultado final mais refinado e aceitável por nós. É importante notar que a maioria das “músicas” criadas por IA são geradas automaticamente por algoritmos e não são necessariamente compostas ou interpretadas por seres humanos.

Este texto que você está lendo foi feito com o auxílio de um mecanismo de inteligência artificial. Através do chatIGP “conversei”, perguntei sobre conceitos e pedi sugestões de músicas produzidas pela IA. Algumas das indicações que você pode ler mais abaixo foram feitas por lá. O mais intrigante foi perguntar se a Inteligência artificial pode substituir os compositores. Vejam a resposta:

“A inteligência artificial (IA) tem o potencial de ajudar os compositores a serem mais eficientes e criativos, fornecendo ferramentas para gerar novas ideias, harmonias e melodias que podem ser adaptadas e modificadas pelos humanos. No entanto, é improvável que a IA substitua completamente os compositores, pois a música é uma forma de arte muito complexa e multifacetada que envolve não apenas elementos técnicos, mas também emoções, criatividade e subjetividade.

Embora a IA possa gerar músicas com estruturas musicais e harmonias interessantes, ela ainda não possui a capacidade de entender as emoções humanas ou os conceitos abstratos que muitas vezes são a essência da música. Além disso, a música também envolve a habilidade de contar histórias e expressar ideias que vão além do domínio da lógica e da tecnologia.

Em resumo, a IA tem o potencial de ser uma ferramenta útil para os compositores, mas não é provável que substitua completamente a criatividade humana na produção musical.”

Com os avanços mais recentes da tecnologia, as produções feitas pela IA vem mesmo ajudando cada vez mais nas composições de novos artistas, mas também criando praticamente obras inéditas de artistas conhecidos. Várias músicas feitas por máquinas vem chamando atenção sobre o futuro do trabalhos não apenas de compositores, mas de produtores, beatmakers e até de cantores.

Um estudo da Ditto Music (veja aqui), empresa britânica de distribuição de música, divulgado recentemente apontou que o uso da inteligência artificial já é uma realidade para a maioria dos artistas na criação de novas músicas. A pesquisa com mais de 1.200 usuários mostra que 59,5% dos artistas já estão usando a IA em seus projetos. Entre os que não estão usando, 47% dizem que usariam a tecnologia em suas composições. Apenas 28,5% disseram que nunca considerariam o uso de inteligência artificial no processo de criação de suas músicas.

Conheça algumas das músicas mais notáveis criadas pela Inteligência Artificial:

Em 2016, a Sony apostou em um novo software de inteligência artificial, o Flow Machines. Para dar um exemplo da capacidade, foi criada uma música pela empresa sueca Amper Music. “Daddy’s Car” foi composta, arranjada e produzida por um algoritmo no estilo dos Beatles.  Ainda não era uma reprodução tão fiel, mas já sinalizava o que estava por vir.

Através da mesma plataforma de inteligência artificial Amper, foi criada a música “Break Free”. Composta e produzida inteiramente pela IA, contou com colaboração da artista norte-americana Taryn Southern. Ela escreveu a letra e as melodias vocais, além de ter gravado os vocais. Lançada em 2017, a música chegou ao Top 100 das paradas de rádio no ano seguinte. A ideia da música partiu de uma brincadeira de Southern com aplicações gratuitas, mas, depois do resultado positivo, ela se entusiasmou e decidiu fazer um álbum inteiro utilizando softwares de IA. Com temas sobre o futuro e a perspectiva de um humano que deseja escapar das limitações da existência biológica, o disco “I AM IA” acabou sendo o primeiro completamente composto em um software de inteligência artificial.

A OpenAI, uma instituição independente de pesquisa na área de inteligência artificial, tem colocado a discussão da criação de música pela IA em pauta promovendo avanços na área. A organização mantém um projeto chamado Jukebox (veja aqui), que cria canções baseadas em diversos astros da música através de uma rede neural. 

O algoritmo da plataforma funciona por meio de uma técnica de aprendizado de máquina que gera resultados a partir de meio de milhões de dados. As criações incluem a parte instrumental, as letras e até mesmo uma simulação da voz dos artistas. Eles já simularam o trabalho de artistas consagrados como Katy Perry, Frank Sinatra, Elvis Presley, entre outros.

Falecido em 2019, o rapper Juice Wrld ganhou uma música inédita feita pela IA. A ideia de “These Days” partiu de um grupo de fãs, que deixou claro que postaram a faixa apenas por diversão e de forma alguma pretenderam tirar algo do legado de Juice.

Uma das artistas mais vangardistas do pop mundial, Björk já está sintonizada com as inovações tecnológicas na música há algum tempo. Em parceria com a Microsoft, a cantora islandesa criou uma canção que muda de acordo com as condições climáticas e a posição do Sol. Batizado como “Kórsafn” (algo como “arquivo de coro”), a proposta utiliza a inteligência artificial, compilando sons dos arquivos musicais de Björk. No projeto, a música se adapta de acordo com a posição do Sol ,captada através de uma câmera instalado em um hotel em Nova Iorque, reorganizando os arranjos a partir dessa informação. 

Em 2023, as versões feitas pela inteligência artificial ganharam mais força. Em abril, viralizou no Twitter uma gravação que trazia a voz da cantora Rihanna cantando uma versão de “Cuff It”, hit de Beyoncé. A gravação surgiu na conta Rihanna Facts, que diz ter gerado o material via ChatGPT, da OpenAI. 

Outras músicas que seguem essa mesma lógica vem surgindo a todo momento na internet criadas pelos sistemas de IA. Uma das geradas por ela foi um cover do rapper Kanye West cantando “Passionfruit”, de Drake.

Mas que tal uma versão de God Only Knows”, dos Beach Boys, feita pelos Beatles? A música ganhou um dueto entre as duas bandas feito por um software. A gravação traz a voz principal imitando a de Paul McCartney, enquanto John Lennon e Ringo Starr fazem as harmonias junto com Brian Wilson e o restante dos Beach Boys, Impressionante.

A criação é de Dae Lims, um fã dos Beatles, que foi além e reimaginou também canções solos dos integrantes  em novas versões, agora com a banda.  “New”, de Paul McCartney – o primeiro single e faixa-título de seu álbum de 2013 – e “Grow Old with Me”, de John Lennon, que foi lançada em seu álbum póstumo Milk and Honey em 1983, são as duas músicas que ele recriou no YouTube. É como se os trabalhos solos fossem gravados na verdade pelos Beatles.

Banda encabeçada por Courtney Love, o Hole lançou, em 1998, seu maior sucesso com álbum  Celebrity Skin. O principal hit do disco é a música título, que ganhou através da IA uma versão cantada por Kurt Cobain, companheiro de Love morto em 1994. As más (e machistas) línguas diziam que boa parte dessas composições do Hole eram na verdade de autoria do ex-líder do Nirvana. Agora podemos ver mais ou menos como ficaria com ele nos vocais.

O culto a Kurt Cobain parece ser dos maiores alvos na inteligência artificial. O projeto Lost Tapes Of The 27 Club foi outro que criou novas músicas cantadas pelo líder do Nirvana. Neste caso, obras inédias e não apenas dele. A organização Toronto Over The Bridge utilizou um software para escrever e gravar novas músicas no estilo de Kurt Cobain do Nirvana (“Drowned In The Sun”), Amy Winehouse (“Man, I Know”), Jimi Hendrix (“You’re Gonna Kill Me”) e Jim Morrison do The Doors (“The Roads Are Alive”). Todos eles eram jovens que faleceram aos 27 anos de idade, daí o nome do projeto. A ideia é chamar a atenção das lutas enfrentadas por músicos com depressão e conscientizar sobre a importância dos problemas de saúde mental.

Com a morte de Kurt Cobain há quase 30 anos, o Nirvana não existe mais. O Iron Maiden não lança músicas originais há meia década. Mas o YouTuber Kirt Connor, dono do canal Funk Turkey (@KirtConnorMusic), tem utilizado a inteligência artificial para criar “músicas inéditas” de algumas de suas bandas preferidas. Há poucos anos ele começou a brincadeira e já lançou faixas de nomes como Iron Maiden, AC/DC, Red Hot Chili Peppers, NIrvana, Metallica e Led Zeppelin.

Para produzir as músicas, Connor utiliza os robôs do site lyrics.rip para criar as novas letras. A plataforna cria a partir de composições existentes das bandas num banco de dados, utilizando um sistema matemático da cadeia Markov. Para finalizar, ele, que também é músico, grava os vocais, toca os instrumentos, mixa e masteriza tudo na própria cozinha. Ele utiliza instrumentos que vão de uma “Stratocaster barata”, um “microfone ruim” e uma “cópia antiga do ProTools”. Se o resultado não agrada a todos, ao menos mostra a criatividade a nossas mãos.

No Brasil, a IA conseguiu lançar uma música inédita de Sabotage. ”Neural” foi feita a partir de uma parceira do RZO com o rapper falecido em 2003. A música foi anunciada como o primeiro rap do mundo criado a partir da combinação de uma rede neural artificial e da intervenção humana criativa dos co-autores da música. Através da tecnologia foram geradas novas rimas após análise das letras e manuscritos deixados por Sabotage. A gravação traz, além de RZO, a participação da Família Sabotage e de Negra Li.

Entre todas estas, talvez a iniciativa mais genial seja o Aisis, uma banda que emula o Oasis, com uma precisão impressionante da voz de Liam Gallagher recriada por meio de IA. A ideia partiu de dois fãs que não aguentavam mais esperar pelo retorno dos irmãos Gallagher. Eles já tinham músicas escritas para uma banda chamada Breezer, formada há dez anos. Decidiram então usar a voz de Liam nas composições através das máquinas.

O resultado é a criação do que seria um álbum perdido do Oasis, que estaria supostamente entre o terceiro e o quarto lançados pela banda. Contando com oito faixas e uma introdução, “The Lost Tapes Vol.1” teve aprovação do próprio Liam. Questionado sobre o projeto ele respondeu: “Não (ouvi) o álbum (todo), ouvi uma música. É melhor do que todos as outras porcarias lá fora”. Em outro momento disse “Mad as fuck I sound mega” (algo como “Iradao para caralho, eu estou soando mega”).

Para quem gosta de música sem preconceitos.

O el Cabong tem foco na produção musical da Bahia e do Brasil e um olhar para o mundo, com matérias, entrevistas, notícias, videoclipes, cobertura de shows e festivais.

Veja as festas, shows, festivais e eventos de música que acontecem em Salvador, com artistas locais e de fora dos estilos mais diversos.