Em encontro com músicos baianos, jornalista e produtor francês Rémy Kolpa Kopoul mostrou oportunidades da música da Bahia na Europa e defendeu criação de um site que agregue as novas produções baianas.
Um público não muito grande, mas diverso e de qualidade, esteve presente na última terça-feira (22), no auditório do Sebrae, para a mesa “Oportunidades na Europa para a Música da Bahia”, onde o jornalista francês, DJ e produtor musical, Rémy Kolpa Kopoul apresentou sua visão sobre a música brasileira e baiana e como alcançar o mercado europeu. A iniciativa foi promovida pela Secretaria de Cultura do Estado – SecultBA, em parceria com o SEBRAE, e integra o Programa de Mobilidade Artística da Assessoria de Relações Internacionais.
Artistas e produtores ligados ao mercado musical baiano de vários estilos, rock, pop, ritmos populares, samba chula, reggae, MPB, axé, entre outros, puderam entender como pensa uma das mentes responsáveis por levar a música brasileira e baiana para a Europa desde os anos 70. Entre os presentes na plateia estavam os cantores Gerônimo, Fábio Cascadura e Messias, integrantes da banda Radiola, os produtores de grupos de cultura popular Marcelo Rabelo e Edvaldo Bolagi, o produtor de Armandinho, João Falcão, entre outros.
Em uma apresentação sem muitas cerimônias, Rémy fez questão de deixar claro que não existe uma receita para exportar a música baiana para a Europa. Entre os fatores que considerou importante para que essa música volte a freqüentar o Velho Continente, destacou o foco na singularidade dos trabalhos produzidos aqui. Segundo ele, revistas, festivais e rádios europeus são curiosos e abertos às sonoridades latinas e brasileiras, mas privilegiam o lado singular, seja na modernidade, seja na tradição. “Isso é o verdadeiro passaporte para se mostrar no exterior”.
Perguntado sobre a receptividade de gêneros mais universais, afirmou que o jazz tem suas singularidades e tem espaço. Já o rock, fora o de língua inglesa, é de consumo nacional. “Não acho que desperte muito interesse”. E reforça, mais uma vez, que “fora isso, tudo que sai daqui pode chamar atenção, desde que seja singular”.
Lembrou ainda que uma das formas dos artistas alcançarem outros públicos é permitirem a remixagem de suas músicas por DJs. “Remix hoje é uma coisa muito importante. O artista pode pensar que a música pode não pertencer mais a ele, pode até ser verdade, mas é uma forma de quem ouve voltar à música original. Hoje em dia não se pode deixar isso de lado”, defendeu Rémy. O jornalista chamou atenção também para a necessidade da criação de um site com um levantamento das produções existentes na Bahia, reunindo tudo, que contribua para que elas possam circular. “Existem talentos novos surgindo. Na Europa, a imagem dos artistas brasileiros é quase sempre de gente acima dos 60 anos. Chegou a hora de mostrar que existem outras coisas”.
Música baiana na Europa
Rémy mostrou suas credenciais, contando desde quando começou a ter contato com nossas músicas, ainda nos anos 70, com a presença dos exilados políticos na Europa, como Caetano Veloso, Chico Buarque e Gilberto Gil. No final daquela década veio pela primeira vez para o Brasil e para a Bahia, onde conheceu o Carnaval, o qual fez questão de destacar sua importância. “Até final dos anos 70 a Bahia não era uma palavra significativa em termos de música para nós. Os baianos (Caetano, Gil…) eram vistos como brasileiros apenas, não tinham a caracterização da Bahia. Somente nos anos 80, com a presença de Carlinhos Brown, Daniela Mercury, Margareth Menezes, Olodum, Ilê Aiyê, Araketu que se consolidou o nome Bahia. Eles não foram sucesso nas paradas, mas conseguiram espaço nos festivais de verão, que são muito importantes na Europa”, afirmou. Foi com esses artistas, segundo ele, que a música feita na Bahia ganhou uma caracterização própria.
Mostrando bom conhecimento da música baiana, o jornalista destacou que nos anos 90 esses nomes continuaram circulando pela Europa, mas não salientou que não houve renovação e essa música deixou de ser novidade. “Nessa época, Pernambuco passou a ter mais espaço, com apoio das instituições governamentais. A Bahia parece que ficou satisfeita com o que tinha e faltou um apoio maior das instituições. A Bahia passou a dormir um pouco nesse desenvolvimento. É importante que as novas gerações se projetem”, disse.
Para ele, a Axé Music, de certa forma, é prejudicial para a imagem da música baiana. “Na verdade, nem tudo nela é de baixa qualidade. Só que hoje não é mais novidade, não é mais produtiva. Claro que existem coisas que tem a ver com isso e que são fortes. É algo fundamental na musica daqui”. Lembrou, no entanto, que falta um confrontamento da música afro baiana com a música da África, um encontro do que é produzido hoje nesses dois universos. “Precisa para se enriquecer, para ter mais opções em termos de música”.
Novos nomes baianos
Rémy veio à Bahia não apenas mostrar seu conhecimento, mas também conhecer. Fez um passeio pelo Recôncavo baiano, visitando o grupo Maracangalha e os cantadores Pedro Alves e Eugênia; a Casa de Samba, grupos de Samba de Raízes e Chula de São Braz, em Santo Amaro da Purificação; Domingos, Preto e Geração do Iguape em Iguape; Samba das Raparigas em Saubara. Fez também uma visita especial a Cachoeira, assistiu alguns shows e ensaios, incluindo Armandinho, Bloco Muzenza, Cortejo Afro, Magary e Orkestra Rumpilezz; além de ter tido um encontro com Hugo Sanbone Orquestra de Pagode.
Foi esse último um dos nomes destacados por Rémy. Para ele, um dos mais inovadores da Bahia, mas não dos mais fáceis para exportação, devido à quantidade de músicos. “A Sambone é uma imagem fantástica, singular. Os arranjos são sofisticados, uma música que nem aqui se conhece”. Ressaltou que há uma premissa de novas coisas acontecendo no estado, não um movimento em si mesmo, mas existem coisas novas.
Destacou também o samba de roda e a chula do Recôncavo. “Ali tem uma coisa de raiz que existe que é das antigas e que pode crescer. Essa música vale a pena mostrar, tem a ver com a música da África. Mesmo com suas guitarras saturadas agradam um certo público na Europa”. O jornalista realçou também as misturas urbanas, de ritmos diversos com o eletrônico, feito por DJs ou produtores. Na Bahia, chamou a atenção o disco do Baiana System, com sua mistura com o dub jamaicano. “É bom os músicos daqui viajarem pra se confrontarem com essas outras culturas”, disse.
Rémy destacou ainda o trabalho do baiano-argentino Ramiro Musotto, morto em 2009. “Pra mim foi o melhor dos últimos anos feito no Brasil. Ele desenvolveu um trabalho com orquestra de berimbau e no último disco, ‘Civilização & Barbarye’, mostra um caminho único. É o disco mais inovador do Brasil nesses últimos anos. Ele está fazendo muita falta aqui e também na Europa. Ele deixou muita gente impressionada com seu trabalho”.