Música e política sempre andaram juntos, apesar de muitos negarem. Mesmo fazendo música instrumental, a IFÁ é um desses artistas que sempre colocou a postura política aliada à força da música. Em seu novo single, lançado nesse importante dia da Consciência Negra e batizado como “Manifesta”, o grupo coloca o dedo na ferida mais uma vez. A música serve como prévia do novo disco e traz junto com a gravação um manifesto assinado por um dos mentores da banda, o baixista Fabrício Mota.
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No manisfesto o single é tratado como “um grito pelo direito de expressão, pela conquista da liberdade!” diante dos tempos confusos que vivemos no Brasil. Mais, mostra como a IFÁ trata as artes como um das formas para encontrar caminhos para superarmos a realidade que cada vez mais se descortina à nossa frente. “As artes têm a missão de propor novos horizontes de interpretação, novas formas de organização da vida, revelando novas escutas, novos cenários, novos mundos”.
Mas melhor do que explicarmos, vale a leitura do manifesto e a audição da nova faixa do grupo. A faixa, composta por Átila Santtana, Fabricio Mota, Jorge Dubman e Vinícius Freitas, traz o som marcante do grupo, aqui mesclando tão bem black music e afrobeat. Resta aguardar o esperado novo disco da banda.
“MANIFESTA”, um manifesto!
Música e História são ingredientes indispensáveis para a mistura sonora da banda IFÁ. Temos transformado as referências sonoras da Diáspora negra em combustível para nossa trajetória no mundo das artes. Particularmente nesse momento de severas mudanças contra o nosso país, encontramos na música uma maneira de expressar nossos questionamentos sobre os rumos de nossa sociedade, sem perder de vista as matrizes que, do passado, nos constituem. Nesse momento de ir pra luta, de “cair pra dentro” como se diz cotidiano “de verdade” da cidade de Salvador, uma nova música chega ao público: a faixa MANIFESTA. A composição surge da vontade de fortalecer a coragem ameaçada pelo temor! É um grito pelo direito de expressão, pela conquista da liberdade!
Há meio século um furacão de mudanças varreu o mundo! No coração da América do Sul alguns segmentos da juventude artística organizaram-se sob o manifesto da Tropicália rompendo o enquadramento estético, questionando a censura, plugando-se com outras rebeldias urbanas de seus contemporâneos e reconhecendo um brasil negado pela Ditadura. Guiada pela intuição criativa do mestre Gilberto Gil, organizador da trupe, a Tropicália renovou as formas de produção da música no Brasil e apontou para caminhos alternativos cujos passos tem sido caminhados até os dias de hoje.
Em paralelo, os movimentos pela descolonização das mentes e povos da Diáspora negra, engrossava fileiras nas Américas, África e Ásia e a visibilidade da luta pelos direitos civis revelava-se sob uma trilha sonora própria: a Black-Soul Music! Semeada pela descendência africana de gêneros com o Blues, originalmente germinada Estados Unidos, essa contracultura transformou-se numa referência identitária multinacional, ganhando sentidos novos em cada contexto em que atracava nesse movimento, uma grande circulação de ideias e sons marcou as décadas que passaram e os reflexos são ainda parte do processo criativo de grupos como o IFÁ.
Hoje, 50 anos depois atravessamos tempos de turbulência onde o exercício da liberdade criativa segue correndo perigo! Em tempos de terror seremos sempre personagens de luta e através da arte nos sentimos mais fortes! Por princípio (e contra alguns) as artes têm a missão de propor novos horizontes de interpretação, novas formas de organização da vida, revelando novas escutas, novos cenários, novos mundos. É nesse sentido que dirigimos nossa energia artística pra colocar os pés a favor de conquistarmos dias melhores! Movendo-nos sob a necessidade de olhar pra frente e seguir o baile, mergulhamos nas trilhas sonoras de nossa História, buscando inspiração em nossa Ancestralidade – o movimento humano de refazer-se erguendo marcas que ao longo do tempo constituem formas de identificação na multidão. Essas influências estão na leveza guerreira do IJEXÁ – gênero musical de matriz africana difundido no Brasil pelas comunidades religiosas e através dos Afoxés em todo o Brasil há mais de 120 anos – ou mesmo no balanço do FUNK – trilha sonora da luta pelos direitos civis, forte referência para o trabalho de um dos maiores mestres da música brasileira: TIM MAIA! Trazendo a temperatura elevada dos BAILES BLACK, surge a música MANIFESTA, onde amor e revolta dançam na mesma pista!
Fabricio Mota, 20 de novembro de 2018.