Há tempos o Festival de Verão necessita de uma mudança em sua lógica. Apesar de ser um dos mais bem organizados dos grandes festivais brasileiros, o evento vinha perdendo a força e ainda assim insistia em ser uma prévia do carnaval baiano, com nomes de axé e pagode, muitas vezes sem expressão alguma. O anúncio de mudança para 2015 foi muito mais tímida do que se esperava. Além do mais do mesmo, o palco principal da edição do ano que vem, que acontece de 22, 23 e 24 de janeiro, terá shows internacionais da banda Sublime with Rome e Kesha, nomes relevantes nacionais, como Banda do Mar e Caetano Veloso, e um encontro musical comMaria Rita, Alcione, Arlindo Cruz e Jorge Aragão. A tenda eletrônica cresce e o palco dois recebe nomes como Tom Zé, Russo Passapusso e Marcelo Jeneci.

Ainda sem conseguir estabelecer um teto mais alto entre as atrações internacionais, o festival ao menos parece que vai apostar mais nesse segmento. Na coletiva de lançamento do evento, o executivo da iContent, responsável pelo evento, Estácio Gonzaga, disse que a empresa pretende promover shows internacionais durante o ano em Salvador. “Nossa meta é inserir a Bahia na rota dos grandes eventos nacionais e internacionais”, disse. No entanto, sem revelar nada concreto, disse apenas que a empresa está promovendo o show de Roberto Carlos. Errou feio também quando se defendeu de ter apenas artistas internacionais de segundo escalão dizendo que grandes atrações não tocam em festivais.

Apesar de seguir a lógica de anos anteriores, com nomes mais aclamados pelo passado, inserir Sublime with Rome foi um acerto e pode ser um bom caminho. A banda americana de ska punk e reggae tem um passado honroso, com hits como ‘Santeria’, mas, com a morte do cantor original, atende como Sublime with Rome desde 2009, com a inclusão do vocalista e guitarrista, Rome Ramirez. A banda, que costuma fazer bons shows, esteve no Brasil em 2010, dentro do festival SWU. Já Kesha. Bem, é mais uma dessas jovens cantoras com sucesso radiofônicos para adolescentes mesclando pop dançante e rap.

Os encontros promovidos pelo Festival de Verão deve render bons momentos. Inicialmente, estava previsto o show de Zé Ramalho e Fagner, mas não se concretizou. Até agora, de confirmado está o encontro do samba, com Alcione, Arlindo Cruz e Jorge Aragão, para o último dia de festival. Estavam previstos ainda encontro de nomes mais ligados a Axé Music e outro a MPB, mas só o de samba vai acontecer.

Além das atrações internacionais, as únicas atrações inéditas do palco principal do Festival de Verão são a banda Malta, a Banda do Mar, com Marcelo Camelo e Mallu Magalhães, e os sertanejos Cristiano Araújo e Lucas Locco, descrito por Estácio Gonzaga, executivo responsável pelo evento, na coletiva de lançamento, “como aquele que participa do ‘Dança dos Famosos’ no Faustão”. A grade do palco principal tem ainda nomes que sempre tocam no festival: O Rappa, Ivete Sangalo, Aviões do Forró, Harmonia do Samba, Capital Inicial, Cláudia Leitte, Saulo e Psirico. Um grande esvaziamento, por tanto, da música baiana de Carnaval, com a trinca axé, pagode e arrocha bastante reduzida, com apenas 5 dos 16 nomes que formam a grade final.

A programação do palco principal do Festival de Verão fica assim:

Dia 22/01 – Quinta
– Capital Inicial
– Claudia Leitte
– Kesha
– O Rappa
– Arlindo Cruz, Jorge Aragão e Alcione

Dia 23/01 – Sexta
– Banda do Mar
– Caetano Veloso
– Ivete Sangalo
– Harmonia do Samba
– Cristiano Araújo

Dia 24/01 – Sábado
– Malta
– Lucas Lucco
– Sublime with Rome
– Saulo
– Aviões do Forró
– Psirico

A Tenda Eletrônica cresceu, passou a ser denominada de Arena Eletrônica, com capacidade para cerca de 5 mil pessoas e terá nomes como Tito (França), Dubvision (Holanda), Gui Boratto, Life is a Loop, Naza Brothers, A Liga, Júnior C, Press On e Phenomena. As boas novidades ficaram para o Palco Sensações, nome que batiza o velho palco 2, que, infelizmente, continua sendo um pequeno espaço dentro da imensidão do Parque de Exposições, onde acontece o festival. A ideia de criar palcos de tamanhos mais próximos ao principal foi descartada. O Sensação terá capacidade para cerca de três mil pessoas, mas pelo menos a aposta volta a ser mais em música e menos em entretenimento, com nomes como Tom Zé, Russo Passapusso, Marcelo Jeneci, Ana Cañas, Teatro Mágico, além de festas, coletivos, feira de moda e artes, grafite e bandas baianas que ainda não foram divulgadas.

Tom Zé retorna a capital baiana, mostrando seu mais novo disco ‘Vira Lata na Via Láctece’, e traz um ar menos padronizado ao festival. Assim como Russo Passapusso, que traz pela primeira vez para Salvador seu trabalho solo, do elogiado primeiro disco ‘Paraíso da Miragem’. Marcelo Jeneci é outra aposta interessante, com o paulista retornando poucos meses após fazer show na cidade para mostrar se show ‘De Graça’. Tem ainda o show performático do Teatro Mágico, a cantora Ana Cañas, e a banda Surikato.

As festas e coletivos dão um sabor a mais para o festival, reunindo alguns produtos interessantes que animam a noite soteropolitana. É o caso do Ministereo Público, que há anos promove semanalmente a Quintas Dancehall com foco em música jamaicana moderna, ou a festa Baile Esquema Novo, que acontece há quase sete anos com foco na diversidade da música brasileira. A convidada de fora é a festa paulista Venga Venga, que mescla batuques africanos, música dos Balcãs com psicodelia turca, carimbó, kuduro e batidas eletrônicas.

Tem ainda o projeto do dj Dudoo Caribe com Germano Estácio, o Ambulante Original, que mistura cultura popular, customização de alto-falantes e mídias alternativas e passeia por literatura de cordel, artes visuais, sound system, Hip-Hop e reggae. Além do carrinho multimídia Bereguedê Transeunte, do percussionista Batata.

Alguns anos atrás, o Festival já deu alguma importância para as atrações além do palco principal. Neles já haviam havia reunido nomes relevantes, como em 2005, que recebeu Gram, Black Alien, Matanza, Ludov, Dead Fish, Radiola, Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicleta, The Honkers, Rebeca Matta e Lampirônicos. A edição de 2015, parece retomar essa atenção.

A programação do palco Sensações fica assim:

Dia 22/01 – Quinta
– Tom Zé
– Encontro Jamz & Suricato
– Festa Venga Venga
– Bereguedê Transeunte

Dia 23/01 – Sexta
– Russo Passapusso
– Ana Cañas
– Ministereo Público

Dia 24/01 – Sábado
– Marcelo Jeneci
– Teatro Mágico
– Baile Esquema Novo
– Peu Meurray

Evidente que o festival não iria mudar radicalmente e se tornar de repente um apostador das novidades ou um festival de pop rock. Nem tampouco se transformaria num evento focado no melhor da música brasileira. O menor conhecimento de música do que de entretenimento dos frequentadores dos corredores da Rede Bahia e a relação com a Rede Globo e seus produtos não poderia deixar de influenciar o festival. Daí nomes como Malta (no palco principal), Jamz e Surikato (no Sensações) ou a inexpressiva banda de axé de João Pessoa, Bereguedê (também no Sensações). As três surgiram no programa Superstar e por mais que se defenda a competência que teriam em fazer um pop rock, existem centenas de opções mais relevantes no mercado.

Não dá pra desprezar a dificuldade nos dias atuais de se montar uma grade com atrações brasileiras, populares, que atraia cerca de 40 mil pessoas, e manter um certo nível de qualidade. O mainstream passa por um de seus momentos mais lamentáveis na música brasileira. Se pensarmos que os últimos nomes de peso com alguma qualidade que surgiram foram Pitty e Skank, surgidas há mais de dez anos.

Talvez o apelo para atrações internacionais, que já foi rechaçado por outros produtores do festival, seja mesmo o caminho. Talvez a Rede Bahia, com seus diversos veículos, incluindo emissoras de TV com grande audiência, possam também contribuir oferecendo mais diversidade e novas possibilidades de música para o público. Talvez o Festival de Verão possa continuar dando vazão a produção local, tanto em ritmos mais populares como pagode e arrocha, quanto na hospitalizada Axé Music, mas também valorizar de verdade a cena musical “independente”. O festival tem poder para tanto, precisa saber se quer isso de fato.

  1. Difícil imaginar que o Festival de Verão, o Carnaval de Salvador e, quem diria, o São João realizado no interior do estado se abram radicalmente para outras sonoridades que não as estabelecidas pelo mercado – no caso específico do São João, aos artistas locais que mantêm vivo a duras penas o forró pé-de-serra. A razão soa até simples, os frequentadores desses eventos passam o ano todo ouvindo aquilo que é veiculado massivamente pelas rádios e pela televisão e, quando da realização desses eventos, elas irão querer ver e ouvir aqueles artistas que massivamente foram executados. E os empresários, loucos para maximizarem seus lucros, não irão navegar contra a maré que eles mesmos forjaram.

    Enquanto a lógica permanecer tal e qual, tal e qual será a grade do festival. Reservando um espaço menor àqueles que não possuem a mesma visibilidade que os “grandes artistas” e que por tal razão possuem um espectro de público mais modesto.

    Longe de ser dos mais democráticos, o Festival de Verão consegue atender a diferentes públicos (mesmo que timidamente). Mais uma vez, lá não estarei, mesmo com shows de artistas que admiro e que estão lançando disco novo, como é o caso do Tom Zé e do Russo. Espero que eles se apresentem com seus novos discos novamente por aqui em outro contexto, assim como fez o Jeneci (outra atração interessante do Festival), ontem, no Pelô.

  2. Em relação aos que já vi é uma “evolução” considerável…mas odeio show em local grande…eu até veria o Sublime num local menor…mesmo sem o vocal original…mas será que não tinha uma banda na ativa pelo mesmo cachê?
    se bem que tenho até medo pelo que trariam…

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