Em apenas 19 minutos, o documentário ‘Salcity’ mergulha no Rap e a cultura hip hop de Salvador. Um universo cada dia mais rico, forte e representativo das ruas da cidade. Sem pretensão de ser definitivo e nem abordar todos os aspectos da cena local, o filme faz um rápido, mas bom panorama da produção local. Traz participações de nomes da nova e da antiga geração. Artistas como Baco Exu do Blues, Vandal, Cintia Savoli, Galf (Ugangue), Mobbiu (ex-Versu2), Dimak, Dj Leandro Vitrola e Opanijé. Eles tratam desde os problemas sociais de Salvador à importância do movimento rap na cidade.
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Não poderia ser diferente num filme de rap, não dá para dissociar a música da realidade social. Ainda mais numa cidade como a capital baiana, com uma enorme população negra. Ao mesmo tempo, muito pobre e oprimida, e uma desigualdade assustadora.
Por isso estão lá temas como racismo, guerra de facções do tráfico e a crua realidade de Salvador. A partir desses motes, o filme mergulha no rap soteropolitano. Além de como como ele se tornou mais agressivo, da força que tem tomado, da invisibilidade na mídia e de seu papel.
Radiografia da cidade
Para Douglas da Nóbrega, um dos diretores do filme, quem melhor tem feito essa radiografia dos problemas sociais em Salvador é o rap e o pagodão. Não por acaso, são os gêneros musicais mais produzidos e ouvidos nos guetos, favelas e subúrbios da capital baiana.
“No Brasil, é quase uma regra que quando a periferia tem voz ela vem para reclamar o que é dela por direito. Seja problemas sociais ou uma visão própria sobre amor, sexualidade, homossexualidade, política, felicidade, festa, entre outros assuntos”, afirmou em entrevista via internet.
A ideia de fazer um documentário registrando o rap soteropolitano começou quando Nóbrega juntou o dinheiro que ganhava com freelas. Pegou uma câmera emprestada e caiu na estrada de São Paulo à capital baiana registrando a produção. Encontrou Dimak, um mestre em graffiti e rap do hip hop de Salvador. Ele passou a contar diversas histórias do começo do hip hop em Salvador e do que estava rolando na cena atual. Aquilo acendeu o desejo de registrar a história e a importância do movimento.
Naquele momento, a música ‘Sulicídio’ do baiano Baco Exu do Blues causava furor na internet e no rap nacional. A frustração é que a maioria das pessoas não teria entendido o que eles estavam querendo falar e os problemas que eram abordados na música. Foi o que faltava para fechar a ideia de documentar o que estava acontecendo no rap de Salvador.
Em busca do reconhecimento
Se o documentário exalta o rap na Bahia, ele não se furta de falar também dos problemas. Mostra as contradições, a desvalorização da produção local e as diferenças do que é feito no Nordeste em relação ao do Sul/Sudeste. Douglas da Nóbrega diz que a maior motivação de fazer o documentário é deixar um registro para as próximas gerações da cena local. Além de contribuir para o rap da Bahia continuar no processo de fortalecimento.
“Tem muita gente boa que as pessoas não dão moral. Gostaria muito que os MCs, DJs e produtorxs recebessem mais oportunidades depois do documentário. A minha expectativa é receber mais comentários iguais ao de um menino daqui da Bahia que não conhecia a própria cena. Ele disse que depois do documentário abrimos a cabeça dele para ouvir novos artistas daqui”.
Se o rap local anda cada vez mais forte e ocupando bem os espaços de representatividade, ainda está longe de se tornar profissional e viável como modo de vida para os envolvidos. “Acho que está caminhando para isso, porém pouquissimxs MCs, DJs e produtorxs conseguem sobreviver de rap. Houve uma maior abertura da mídia, de alguns contrantes de show e dos fãs pra consumir o rap baiano. Mas isso ainda não converteu em rende e estabilidade para ganhar mais força”, diz Nóbrega.
Resultado de uma iniciativa da produtora de conteúdo Marra, o documentário foi lançado via youtube. É apenas o primeiro deles com foco no gênero . “Estou planejando fazer mais trabalhos sobre a cena hip hop, mas ainda não tenho nada concreto. Provavelmente elas vão se materializar no final do ano. Infelizmente a vontade é muita, mas a grana é pouca”, explica o diretor.