Em primeiríssima mão, o el cabong teve acesso ao disco da banda carioca Do Amor. Desde já candidato a figurar nas listas de final de ano de melhores de 2010, o álbum é um bom aprendizado do que é a música brasileira de hoje. Leve, livre e sem preconceitos. Passeando por rock, carimbó, ijexá, MPB…
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Tentar classificar a música da banda carioca Do Amor é um exercício de perda de tempo. Sintonizada com o que se tornou a música mundial dos anos 90 para cá, o grupo capta um pouco de referências diversas e cria uma sonoridade própria e bem rica. É essa música que o grupo apresenta no disco de estreia, que está sendo lançado este mês de forma independente.
Ainda pouco conhecida, apesar de formada por músicos que quase todo mundo já ouviu, a banda é uma das boas novidades do novo cenário da música brasileira. A formação conta com Gabriel Bubu (guitarra), que tocou com o Los Hermanos durante boa parte da existência banda, Marcelo Callado (bateria) e Ricardo Dias Gomes (baixo), que fazem parte da banda Cê, que acompanha Caetano Veloso desde 2006, e Gustavo Benjão (guitarra), que já tocou com várias bandas e artistas, especialmente no Rio de Janeiro. Todos eles excelentes músicos que, nesse trabalho, assumem também suas facetas à frente dos microfones soltando a voz.
O disco
Se em 2009 tivemos vários ótimos álbuns lançados por nomes mais badalados na música brasileira contemporânea, 2010 está sendo o ano dos discos de estréia. É o caso desse primeiro álbum da Do Amor. Gravado em 2008 e 2009, entre as turnês de metade da banda com Caetano, o disco é um daqueles trabalhos instigantes, que resume o que andou sendo ouvido por essa geração desde os tempos da Mulheres que Dizem Sim, banda seminal para essa turma.
São 14 músicas, com produção de Chico Neves (O Rappa, Los Hermanos, Skank). Uma colcha de retalhos musical que mostrar à diversidade sonora da banda e dá uma personalidade especial à música da Do Amor. Logo abrindo o disco, a banda mostra a que veio. Se tivéssemos que sintetizar o que é a música do grupo, as três primeiras faixas, “Vem me dar”, “Chalé” e “Morena Russa”, cumpririam muito bem esse papel. Um pop essencialmente brasileiro, mas com várias referências acumuladas, daqui ou de fora, em composições caprichadas, redondas, daquelas que você vai acabar se pegar cantando por ai.
O disco abre com o latido da cadela de Chico Neves na faixa “Vem me Dar”, que num clima relaxado já deixa o ouvinte confortável com o que vem dali em diante. A música é extremamente simples, daquelas que pouco revela muito. A guitarra e baixo aparecem fazendo uma base que remete a música africana, com o vocal quase preguiçoso de Benjão levando a bonita letra até encerrar no belo e marcante solo final.
Um pouco mais pra cima, “Chalé” traz elementos bem diferentes, teclados, um som mais pop e o clima mais festivo, aqui com Ricardo assumindo os vocais e as guitarras gritando. “Morena Russa” é um sambinha delicioso, levado na guiitarra, com corinho e clima amoroso. Um início arrebatador.
No decorrer do disco aparecem diversas outras referências, como ecos dos anos 80 em “Homem Bicho”, que remete diretamente ao pop de Lulu Santos, com direito a efeitos eletrônicos e um leve flerte com a disco music no final da música.
O ótimo afoxéfrevo “Pepeu Baixou em Mim” faz alusão direta à música baiana e ao proto-axé de Luis Caldas e banda Reflexu‘s, com percussão discreta, balanço e teclado de trio elétrico e guitarrinha quase baiana faz uma reverência à Bahia. Outra que remete a carnavais baianos das antigas, mas de forma menos direta, é a deliciosa “Perdizes”, com seu groove ultra dançante e guitarrinha lambadeira revelando uma das melhores músicas do álbum.
Tem ainda um skazinho-dub safado cantado em inglês, “Brainy Dayz”. O carimbó, guitarrada e lambada na excelente “Isso é Carimbó”, dançante até o extremo trazendo o Pará para o baile Do Amor. Tem até rock mesmo, pesado, estranho ou nonsense, em “Shop Chop”, “I Picture My Self”, “Exploit” e “Dar uma Banda”, onde brincam com clichês do gênero. Em “I Picture My Self”, por exemplo, Ricardo solta a voz em uma brincadeira com os agudos extremos do heavy metal.
Tem direito até a música mais romântica, que, é claro, traz um jeito próprio da banda de falar de amor, numa baladinha para bater o pezinho, “Meu Corpo Ali”. Fechando o álbum, há uma versão sensacional e surpreendente para “Lindo Lago do Amor”, de Gonzaguinha, algo como um eletro demente ou uma disco-MPB, dando uma cara totalmente nova à música.
Uma cozinha suingada, um interessante trabalho de guitarras, que passeia por reggae, ijexá, fricote, ska, rock, sem nenhum estranhamento, aliado a vocais despretensiosos, antivirtuosos, quase desleixados, e arranjos cuidadosos, repleto de detalhes. Tudo isso à serviço de músicas sem preconceitos, bem feitas e bem humoradas. Sabe aquelas músicas que elevam qualquer astral? Do Amor não falha.
Álbum: “Do Amor”
Gravadora: Independente
Faixas: 14
Ano: 2010