É muito difícil curtir o Carnaval baiano nos dias de hoje. Aliás, já faz alguns anos que é bem difícil sair às ruas durante a festa para quem não gosta do que se transformou a música baiana feita para Carnaval. Mais difícil ainda para quem não aceita ou não tem grana para se adequar ao esquema bloco-cordas-camarote. Para complicar ainda mais, ter que tolerar e conviver com a violência nos dias de festa é um sério complicador. Assim mesmo dá para se encorajar. A Bahia tem coisas especiais no seu Carnaval. Apesar do marketing não é o melhor Carnaval do país, pelo menos não o único.
Recife-Olinda mantém às tradições do frevo, além de inserir outros ritmos tradicionais e mesclar isso com a cultura pop. Não é por menos que esse ano tem Pitty, Nação Zumbi, Bonde do Rolê, Tom Zé, Alceu Valença, muita tradição e uma comemoração sincera dos 100 anos de Frevo. Ao contrário daqui, em Recife a população valoriza de fato a tradição e sua cultura própria. Não é a que é vendida pela TV e rádio. O frevo, por exemplo, não toca em rádios durante o resto do ano. Isso torna ainda mais bonito ver pessoas de qualquer idade e classe social cantando os vários clássicos do ritmo, além de entender porque “Vassourinhas” é sempre tocada. Aquilo mexe com as pessoas. É como ouvir um clássico absoluto do rock, seja “Satisfaction”, “Black Dog” ou “Blitzkreig Bop”, e não se mover, impossível. É algo real, não é uma coisa fake construída. É impressionante como Chico Science é venerado por pessoas de todas as idades e compreensível a importância que se dá a ele. Com o Mangue Beat, os pernambucanos voltaram a valorizar o que eles têm e mais, serviu para abrirem a cabeça para as coisas de fora. Aceitar suas tradições e ao mesmo tempo assimilar influências externas. É um caminho invejável.
Mas estamos falando de Carnaval e outro braço do tripé carnavalesco brasileiro está no Rio de Janeiro. Em meio aos tempos obscuros de violência, parece que o Carnaval tem servido lá também como válvula de escape e libertação dos problemas. Durante anos só o que se via e ouvia falar eram das escolas de samba. Apesar de venderem que o melhor é ficar no camarote com estrelas vendo a banda passar, o mais interesssante, segundo quem lá já esteve, é mesmo desfilar dentro da escola. Sentir a força da percussão e os 20 minutos de emoção no desfile. O Carnaval do Rio vai, no entanto além disso. Hoje, o maior atrativo parece que são mesmo os blocos. São dezenas deles que desfilam pelas ruas da Cidade Maravilhosa com bandinhas tocando todo tipo de música e relembrando carnavais das antigas. Melhor, sem corda, sem dividir quem tem grana de quem não tem, sem servir a apenas uma elite egoísta. Cabe de tudo mesmo nesses blocos, até rock. Um grupo de indies assumidos, por exemplo, criou o Bloco dos Malditos, que vai ás ruas levando brincadeiras e música. Rock? Sim, em pleno Carnaval carioca. Eles criaram até concurso de samba enredo. Para 2007 os candidatos tiveram que escrever letras em português para as músicas, “QUE NEM MEL”, fazendo versão para “just like honey”, do Jesus and Mary Chain, “ELA TOCA O TAMBOR”, criando paródia para “she bangs the drums”, do Stone Roses e ainda “LA VEM TEU MACHO” uma criação em cima de “here comes your man” do Pixies. Olhem essa versão para “Debaser” também do Pixies (há alternativa também para criações fora dos temas) para se ter idéia:
BIA DE BLAZER
(Haemocytometer Metz / Pixies)
Vou pro teu bloco, tua mãe me chamou!!
Sai lá na Lapa, tua mãe me chamou!!
Armei fantasia, tua mãe me chamou!!
Eu vou de aba-jur,
Mas chego lá e
NEM
Meia dúzia
Não tem nem
NEM
Meia dúzia
Não tem nem
NEM
Meia dúzia!!
Que horror!
Olha a Bia!
BIA DE BLAZER!
(de Blazer!)
DE BLAZER!
(de Blaaaaaaazeeeeer!!)
O autor dessa pérola é Lois do Zumbi do Mato, que foi quase unânime e se tornou hors-concours no concurso. Existem outras sugestões, confiram na comunidade, têm mais coisas impagáveis.
Carnaval, música e diversão. E bom humor. Em Salvador, a invasão durante o ano inteiro e durante anos de axé music parece que tirou o bom humor de muita gente, inclusive para o Carnaval. Infelizmente. Infelizmente a festa ficou difícil de se tolerar. Mas também não dá para ficar em casa reclamando. Dá para encarar Armandinho, Dodô e Osmar soltando os clássicos dos velhos carnavais, dá pra para ver convidados interessantes como FatBoy Slim e este ano Layo & Bushwacka, além do After Hours de house no Clube Espanhol, para quem gosta de sons eletrônicos. Tem mais, em plena Praça Castro Alves foi montado o Palco de Hip Hop e Música Eletrônica. Na programação, DJs mais conhecidos como Bandido, Mauro Telenfunksoul, Roger n´Roll, Sartorello, Angelis Sanctus, além de grupos como Quilombo Vivo, Simples Rap´ortagem, o coletivo Ministério Público, entre vários outros. Para quem gosta de samba tem um palco montado na Praça da Sé e trios e blocos reunindo nomes como Riachão (homenageado desse Carnaval), Edil Pacheco, Beth Carvalho, entre outros. O “alternativo” trio de Gilberto Gil, o Expresso 2222, recebe nomes do samba como Zeca Pagodinho, Alcione Arlindo Cruz, e da música pop, como Lulu Santos e Sandra de Sá. Tem também trio com Arto Lindsay, outro com Caetano Veloso e por ai vai. Se você não gosta de nada disso tem opção de reggae com um trio próprio. Tem rock na festa também. Para os mais radicais há a opção de ir para longe, em Piatã, lá rola os shows do Palco do Rock. Mas tem como ver alguns nomes no circuito tradicional. Na quinta-feira na Barra, por exemplo, sai um trio elétrico com as bandas Cascadura, O Círculo e Supergalo (banda nova de Fred do Raimundos). Tem ainda o Palco Transamérica em Ondina (ali na altura da Pref. da Aeronáutica em Ondina). A programação ainda não foi totalmente divulgada, mas se você vai para rua e chegar uma hora e não aguentar mais batuque pode ir lá. Veja a programação:
* Quinta: Meteora e convidados
* Sexta: O Circulo, Canto dos Malditos, Cascadura, Capitão do Cerrado (DF), Diamba, Mosiah e Supergalo
* Sábado: Diamba e convidados
* Domingo: Forrónokilo e convidados
* Segunda: ???
* Terça: Mosiah, Cascadura e Convidados
Outro nome que sempre traz novidades (gostem ou não dele) é Carlinhos Brown. Ele que vive se pronunciando contra essa lógica de bloco-cordas-camarote, têm colocado trio na rua para o povo e esse ano resolveu recriar os bailes carnavalescos. (Abrindo um parênteses enorme. Se formos pensar bem, os camarotes de hoje pode ser comparados com os bailes de antigamente, onde quem frequentava não era o povão, e aquilo era uma forma de separar uma ta ellite da massa. O melhor ficava nas ruas e essa elite perdia tudo que rolava. O lamentável é que hoje às ruas ainda permanecem ocupadas pelos blocos. Se for o caso dos camarotes ganharem força e às ruas voltarem a ser do povo no Carnaval, sem cordas, tem o nosso apoio. Bom lembrar que, o Ministério da Cultura já está pensando em proposta para se repensar o Carnaval de Salvador, agora com um governo aliado a ele e que não reza a cartilha da indústria do Axé (pelo menos até onde se sabe) pode vir um bom futuro por ai. Bom lembrar, que em Recife, Governo e Prefeitura assinaram um documento proibindo blocos com cordas na cidade. Um avanço que só vai contra os próprios donos de bloco e beneficia todo o resto. Voltando a Brown, ele criou este ano o Baile do Bloco Parado que vai reunir da sexta a terça de carnaval nomes como Zélia Duncan, Pitty, Arnaldo Antunes, Chico César, Vanessa da Mata, além de nomes da axé e um DJ de eletrônica. Ah! Pitty vai levar Retrofoguetes para o show dela, marcado pra dia 19, segunda-feira de Carnaval. Vamos invadir a la boate.
