O ex-Honkers e Vendo 147, Dimmy “O Demolidor” da Silva, há alguns anos mora na Austrália. Por lá, montou um novo projeto musical, o Black Diamond Lake, que mantém o peso dos trabalho anteriores do baterista. O primeiro álbum acaba de ser lançado e ganha aqui resenha do colaborador Leonardo Leão.
Veja também:
– 51 novos clipes pra quem acha que o rock brasileiro morreu.
– Discos: Jadsa e sua massa pra biscoito fino.
– Discos: Isaura Tupiniquim e seu universo feminino caótico cyberpunk.
por Leonardo Leão*
E não é que o rock da Bahia está com dois pés fincados do outro lado do mundo? Especificamente em Perth, considerada a metrópole mais isolada do mundo?
Espécie de capital oeste da Austrália, a cidade está localizada entre o Oceano Índico do lado oeste e imensos desertos ao leste, sendo que o grande centro urbano mais próximo está a quase 2,7 mil km de rodovias – mais do que a distância de Salvador a Florianópolis.
Pois foi justamente nesta cidade ao sul do planeta que surgiu a banda Black Diamond Lake, formada pelo baterista Dimmy “O Demolidor” Da Silva, um carioca vascaíno que fez história na Bahia com os grupos Declinium, The Honkers e Vendo 147, e os guitarristas britânicos Mark Linkhorn e Barry Malice-Son, que também é vocalista.
Quem se liga no underground deve ter conferido a banda pelos dois singles lançados em 2020 nos canais digitais ou pelas apresentações “ao vivo” nas lives que a banda fez, inclusive tendo participado da edição virtual do Festival BigBands no ano passado.
Entretanto o mais importante é que o trio “australiano” acabou de lançar seu primeiro álbum: “O Carro em Chamaz” – assim mesmo, com o título em português adaptado – em todas as plataformas de streaming, sendo que no Brasil o lançamento ficou a cargo da Trinca de Selos, formada pelas gravadoras independentes baianas Brechó Discos, Bigbross Records e São Rock Discos, via Trinca de selos.
A produção foi feita por Dimmy e Barry no estúdio Fox Hole (buraco da raposa) lá em Perth e a mixagem foi responsabilidade de Jordan Lacerda no estúdio Golden Trident (tridente dourado) aqui em Salvador mesmo.
Falei, falei mas não falei do som. Então, vamos nessa…
Musicalmente, Black Diamond Lake não segue exatamente uma mesma linha; as composições transitam no espectro stoner rock, mas sem se prender aos clichês do estilo. A banda tem climas que remetem desde o protopunk dos 60’s ao grunge dos 90’s, com passagens num revival do hard rock visceral (não confundir com o hard farofa do 80’s, porque nada nessa banda é levinho, fácil ou descartável). Trata-se de uma banda energética, agressiva, dançante e sombria ao mesmo tempo.
Contraponto é que, apesar do som apenas com guitarras e bateria garantir um peso fenomenal, as músicas do Black Diamond Lake têm espaço suficiente para uns arranjos de contrabaixo, cuja ausência não compromete, mas deixa um gostinho de “está faltando um tempero”.
Já em relação às composições, o disco abre com uma introdução arriscada, já que pode levar o ouvinte a achar que o som da banda será o que se escuta inicialmente, mas após uma intervenção radiofônica feita por Thiago Moura, DJ do dial baiano, o som “de verdade” engata com “Came Home”, que serve de aperitivo.
Na sequência imediata é que o bicho pega e o power trio revela toda sua potência. Tal qual um carro desgovernado pegando fogo (aí o nome do disco se mostra totalmente adequado), Black Diamond Lake emenda cinco cações diretas e pesadas: a proto-punk “Burp”, numa levada MC5 modernoso; a stoner “Doom”; “Klass” com o vocal numa quase pegada Danzig/The Cult; o grunge-country “Riffy”; e “F.O.G.O.”, um stoner doom angustiante, provavelmente a melhor música do álbum.
Após as seis faixas iniciais, o disco “O Carro em Chamaz” dá uma quebrada no clima, o que causa certo estranhamento logo de cara, mas depois se mostra eficiente com a semi-balada “The Wire”, um hard blues num clima Black Crowes com passagens punk.
Logicamente, citar estes subgêneros do rock serve apenas para situar aqueles que gostam de rótulos, porque o que importa aqui é ouvir e curtir o som da banda, sem se preocupar com o que veio antes ou virá em seguida.
Afinal, a quebrada de clima vem mesmo com a canção “Johnny”, que soa deslocada no álbum, sendo uma desnecessária balada-blues de branco britânico australiano, apesar da tentativa de ser pesada.
No passo seguinte, o disco volta ao peso real com a stoner “Boiling”, mas não consegue recuperar o ritmo de tirar o fôlego. A sequência final não é sensacional, mas apenas apresenta as boas músicas “Trussed Up”, “OLODOOM” e “When You Gonna Let Your Hair Down”. Só mesmo a última faixa, “Bug Luv”, uma vinheta de encerramento com levadinha no violão, é completamente dispensável.
Contudo, não se oriente pelo final deste texto e muito menos pelo final do disco. O que ouvimos na primeira metade de “O Carro em Chamaz” é uma ótima e sincera banda, que vem atropelando tudo com o bom e velho rock’n’roll visceral.
* Leonardo Leão é jornalista, radialista, compositor e vocalista da Drearylands @drearylands