Festival SWU

Última noite de SWU e uma sequência histórica com QOTSA e Pixies

Depois de dois dias com reprovação à organização e comentários divididos entre elogios e críticas aos shows realizados, o último dia do Festival SWU prometia ser o melhor e mais diversificado do evento, com nomes tão díspares quanto Linkin Park, Incubus, Cavalera Conspiracy, Pixies e Yo La Tengo. Cerca de 58 mil pessoas estiveram na Fazenda Maeda, em Itu, enfrentando muito frio e uma entrada problemática para assistir um evento no geral (pelo menos nesta última noite) com saldo positivo de estrutura e com uma sequência de shows para ficar na história. Uma visita a eventos como o Festival de Verão ajudaria a resolver alguns dos problemas de logística enfrentados, mas até esperados numa primeira edição de um festival  grandioso como esse.

O local era imenso e a produção conseguiu distribuir satisfatoriamente suas atrações: DJs e projetos  eletrônicos na tenda eletrônica, bandas independentes no palco Oi e dois palcos principais, montados lado a lado, para as atrações  principais. Além disso, havia espaços para alimentação e bebidas, diversão com roda gigante e escalada, entre outros pequenos atrativos. Apesar das reclamações dos primeiros dias, o ambiente era perfeito para um evento desse porte e o clima de pessoas dos mais diversos tipos circulando, com músicas em todos os cantos, contribuiu para estabelecer o clima de festival. Lá dentro tudo funcionava quase sempre muito bem, lembrando, pelo menos nesse último dia.

Festival SWU - cavalera
Cavalera Conspiracy

Ainda com um som aquém de sua capacidade real, o Yo La Tengo desfilou de forma competente seu indie rock nerd, a base de guitarras distorcidas combinadas com canções mais lentas e melodiosas, incluindo as ótimas “Sugarcube”, “Autumn Sweater” e um final na tradicional escola guitarra e microfonias no talo. Logo depois, o palco principal viu o primeiro grande show com a dupla de irmãos brasileiros mais conhecidos do planeta. Ainda estava claro, quando o Cavalera Conspiracy tirou o público do clima de passeio e reconhecimento de espaço que reinava. Os irmãos Cavalera foram os primeiros no dia a mexer com o fio condutor do rock que ligava todos ali. Grande show, com direito a quase apoteótica versão para “Roots Bloody Roots”, da ex-banda de Max e Igor Cavalera, o Sepultura. Mesmo com a imperfeição do som, ganharam o público e fizeram um showzaço.

À esta altura o palco Oi Novo Som já recebia seus principais nomes do dia, com um bom e concorrido show de Mombojó, seguido de Autoramas, B Negão e Cansei de Ser Sexy, este último fazendo, para quem viu, um show marcante de retorno ao Brasil. Entre os nomes brasileiros, houve ainda o bonito show do norte-americano Josh Rouse, que mesmo em um ritmo mais calmo, numa apresentação acústica, a base apenas de dois violões e um contrabaixo acústico, atraiu o público mais velho presente e serviu como um essencial relax prévio ao que vinha a seguir.

Festival SWU - qotsa
Queens of the Stone Age

Após um tão correto quanto chato show da Incubus, que teimava em não terminar, as atenções de quase todos os presentes se voltaram para a atração a seguir, era a vez do aguardado Queens of the Stone Age. A demora de quase uma hora para o início do show chegou a provocar um medo de frustração. Atraso mal explicado para o que foi o maior problema da noite. Mas logo isso viraria detalhe e ninguém lembraria mais.

De repente começam os acordes de “Feel Good Hit of the Summer” e o público se entrega em poucos segundos. Uma abertura digna do que viria dali em diante. Do alto de seus 37 anos, Josh Homme parece mais velho do que é de fato, mas aparenta estar mais sadio do que nunca e comanda um daqueles shows que serão lembrados por muitos anos. Poucas bandas no mundo devem conseguir unir atualmente de forma tão satisfatória técnica, competência ao vivo e um repertório fabuloso como o QOTSA.

Numa série de petardos que guarda o que é mais essencial ao rock, a banda norte-americana fez um show grandioso, proporcional a qualidade musical que apresenta em discos, com uma série arrasadora de hits, matadores, certeiros e sexys. Músicas de praticamente todos os discos, com exceção do primeiro. Certeiras, bravas, com a guitarra grunhindo na garganta e uma banda absurdamente  boa, coesa e fazendo uma exibição digna  de grandes bandas do rock.

Dividindo o show praticamente todo em blocos com músicas de cada disco, o QOTSA pagou o débitode anos sem ter vindo ao Brasil e do queenscriticado show do Rock in Rio de 2001.  Abrindo com a sequência arrebatadora do clássico “Rated R”, a já citada “Feel Good Hit of the Summer” e “The Lost Art of Keeping a Secret”, dando seguimento com duas brutais de “Era Vulgaris”,  “3’s & 7’s” e “Sick, Sick, Sick”. Depois mais uma do “Rated R”, “Monsters in the Parasol”, para um mergulho no “Lullabies to Paralyze”, com “Burn the Witch”,  “Long Slow Goodbye”, “In My Head” e “Little Sister”. A sequência final foi no outro clássico da banda, “Songs for the Deaf”,  que intermediada por “I Think I Lost My Headache”, de novo do “Rated R”, seguiu com “Do It Again”, “Go with the Flow”, “No One Knows” e “A Song for the Dead”, numa  sequência quases irretocável.

Se a imagem de Freddy Mercury cantando “Love ..my life” regendo o público ficou eternizada como símbolo do primeiro Rock in Rio, a apresentação de “No One Knows”, acompanhada com palmas e um público eufórico cantando junto, deve ficar como uma das similares do SWU. Apesar do show relativamente curto, com 14 músicas, sendo que “Misfit Love” foi cortada do repertório, e o gostinho de quero mais, a noite ali já tinha valido a pena. Ficava difícil imaginar como uns coroas de 45/ 50 anos anos, com o último disco lançado há 19 anos poderiam superar aquilo.

Pixies: para fechar noite histórica

Se em 2004, o Pixies veio ao Brasil, logo após seu retorno, com um passado primoroso, mas sem um futuro certo e ainda tentando entender a dimensão da banda na música pop atual, em 2010, o quarteto sabia exatamente o que estava fazendo e como fazer. Com uma popularidade que nunca tiveram antes e uma forma particular de se comportar no palco, sabendo levar o modo low -profile do universo independente até a última fronteira com um festival para 50 mil pessoas.

Festival SWU - pixies2
Pixies

O vocalista mais gordinho do que nunca, Frank Black, encarava o público sem trocar uma palavra, meio enfezado, como se dissesse que é líder de uma das principais bandas de rock dos últimos 30 anos e todos estavam ali para vê-los. Sem parecer esnobe, muito menos humilde, apenas se divertindo à sua maneira com aquilo. Enquanto, a baixista e vocalista Kim Deal, fora de forma, com jeitinho de menino, mas eternamente linda e simpática, com suas poderosas linhas de baixo, fazia as honras, se comunicando com o público, falando em português e até fazendo piadas e brincadeirinhas. Completavam o contraponto, o guitarrista Joey Santiago, que permanecia em seu próprio mundo, com seus timbres únicos e hipnotizantes com referências a mundos tão desconhecidos quanto misteriosos, enquanto o baterista era a outra parte boa-praça, tocando como sempre, visivelmente feliz e se divertindo com o que o Pixies representa hoje.

O entrosamento da banda hoje mostra que os seis anos da reunião do grupo, mesmo não trazendo um álbum novo, fizeram muito bem. Da introdução brutal da bateria de “Bone Machine” que abriu ao show, até o final beirando o sublime com “Gigantic”, o Pixies mostrou porque em seus 11  anos de parada foi daquelas bandas que viu seu público crescer e a idolatria chegar ao nível de dinossauros do rock. Alguém falou em dinossauros? Sim, já é hora de admitir que uma das principais bandas do indie rock mundial se tornou um dinossauro. Muitas vezes mais lento que de costume, como na versão desacelerada de “Here Comes Your Man”, com energia mais dosada, menos peso, vibração e vitalidade, mas, assim mesmo, ainda sabendo muito bem utilizar todos esses elementos e um repertório perfeito para se manter em pé sem soar caquético.

O contraponto entre o vocal mais grave e os berros, mais econômicos do que já foram, de Frank Black, e a marcante voz doce e suave de Kim Deal continuam cativantes e ao vivo ainda mostram vigor. A banda, mais coesa do que em 2004, consegue equilibrar o peso da idade com o poder de suas canções impetuosas e intensas. Um repertório como o que eles apresentaram já sustentaria qualquer apresentação. Incluiu quase todo o clássico “Doolittle” na ordem do álbum: “Tame”, “Debaser”, “Wave of Mutilation”, “Here Comes Your Man”, “Monkey Gone to Heaven”, “Mr. Grieves”, “Crackity Jones”, “La La Love You”, “No. 13 Baby”, “Gouge Away” e “Hey” (a maior ausência do show, “I Bleed”); várias do “Surfer Rosa”  (“Bone Machine”, “Broken Face”, “Vamos” e finalizando com “Where is My Mind” e “Gigantic”); além de incluir os principais hits de “Bossanova” (“Velouria”, “Allison” e “Dig for Fire”) e “Tromple Le Monde”, (”U-Mass” e “Planet of Sound”) e duas dos primórdios tiradas do EP “Come on Pilgrim” (“Isla de Encanta“ e “Caribou”). Mas, ao contrário de dinossauros satisfeitos com o status, o Pixies além de mexer com o lado emotivo, consegue manter um espírito de banda indie, fazendo um show grandioso, mas com uma tática meio despretensiosa, meio petulante, que mantém o frescor que a banda sempre possuiu.

Com o público na mão, a banda não apela para um show de arena, como todo dinossauro que se preza. Até brinca com a fama, com os integrantes não saindo do palco no biz, preferindo ser agraciados ali mesmo e sem dizer nada, se comunicando com gestos, brincando com  stage-diving ou agindo como se fossem seres superiores. Voltam aos instrumentos para um final de chorar, arrebatador, com uma  versão porrada de “Planet of Sound”, uma comovente “Where’s My Mind” com público fazendo um lindo coro e “Gigantic” com o público emocionado, cantando, gritando e sabendo que tinha acabado de ver um show histórico. O festival não se encerra ali, mas dali em diante a brincadeira era pras crianças.

Festival SWU 2011

Já confirmado para o ano que vem, provavelmente no mesmo local,  o SWU deve resolver os problemas da primeira edição. Com um público final de mais de 164 mil pessoas, distribuídos em três dias, com mais de 50 horas de música, e um objetivo  nem sempre muito coerente lá dentro de trabalhar com a sustentabilidade, o festival se estabelece como um dos principais eventos de música pop do país. Segundo a produção, em 2011 é provável que as noites sejam temáticas, com cada dia voltado para um  gênero musical, um dia rock, outro dia para o hip  hop, outro para o pop, por exemplo. Dizem que o SWU já está confirmando as bandas Alice In Chains e System Of A Down para a segunda edição.

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