O cantor e compositor pernambucano Junio Barreto estreia com disco certeiro e bem equilibrado entre tradição e modernidade.
Um pé no terreiro e o outro na tecnologia. Um olho no passado da MPB e outro no que vem se transformando na nova música brasileira. Assim é o disco de estréia do pernambucano residente em São Paulo, Junio Barreto. Muito se tem feito por ai colocando a música brasileira namorando a música eletrônica. Aqui, no entanto, a eletrônica trabalha a serviço das canções, das melodias e da poética de Junio, que acompanhado de um excelente time de músicos, produz um daqueles álbuns para ir absorvendo aos poucos, até ele dominar os sensores sensíveis do corpo. Um disco que coloca o autor entre os principias novos nomes da música feita no Brasil.
Logo de início, em “Qual é Mago”, Junio solta: “Tá com saudade da praia, né nego?”. Um sambinha que dá uma pista da inspiração do autor: os ares de sua terra deixada para trás, que aparece também na capa do disco, em referências a ícones e lembranças nordestinas, como a bandeira do Central de Caruaru e o clima de interior. A referências prosseguem nas poéticas letras, sem soar como um mero neo-cordelista, mas com um toque contemporâneo de quem vive numa metrópole.
Com muita sensibilidade e capacidade de articular palavras e imagens, Junio cria uma linguagem particular nas letras. “Ontem acordei de susto / do ronco da minha barriga com fome/ Bem quando sonhava / que estava jantando / com alguns amigos bons/ Salada e camurim, cajuada aromática/ Jenipapada e alguns amigos bons”, em “Amigos Bons” ou “Ela mandou caiá/ lavar todo o terreiro/ Quis dengo de mão e samba de maracatu/ Deu rosa pa menino/ Buchada de carneiro, ê/ Só porque chegou água na torneira”, em “Oiê”, ou ainda “Raiou mais bela Flô raiou/ Num caísse de leva que seja/ Indo o céu abrir de sol/. E agora a chuvinha que cai de voada maneira/ Molha, molha o chão”, em “Do Caipora ao Mar”.
Junio dá ênfase à percussão em boa parte do álbum, como num terreiro eletrônico, mas com as batidas de candomblé se misturando a loops, samples e batidas digitais. Um passeio pela riqueza da música brasileira, com ecos de bossa-nova, melancolia, samba, Dorival Caymmi e as belas e sensíveis letras. Tudo isso sem soar retrô, muito menos soando como um vassalo dos intocáveis, ou mero refazedor do que já foi feito. Sem soar vazio em querer inventar um futuro inédito.
Como poucas vezes se viu tão bem misturado, o disco reúne nas mesmas músicas moogs, ganzás, tamborins, palmas, harpas, sampler, flautas, congas, vibrafones, pianos, tipos diversos de teclados, violões de 7 cordas, programação eletrônica. O resultado é uma música sofisticada que não soa pretensamente vanguardista, mas que, ao mesmo tempo, mostra um caminho inteligente e promissor para a música brasileira.
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