Emmily Barreto, vocalista do Far From Alaska, fala em entrevista exclusiva sobre a experiência no exterior, o novo disco e muito mais.
Se o grande público não sabe o que se passa na nova música brasileira, imagina como é com o rock. Isso mesmo com a boa safra de bandas que temos atualmente. Nomes como Boogarins, Cidadão Instigado, O Terno, entre outras, trafegam por festivais e pequenas casas de show, algumas já engatam até bem sucedidas carreiras internacionais. É o caso da Far From Alaska, banda com origem em Natal, no Rio Grande do Norte, que acaba de lançar o segundo disco, “Unlikely”, depois de uma elogiada série de shows na Europa. O grupo é uma das atrações do festival Radioca (veja programação) e pela primeira vez se apresenta em Salvador. Para falar sobre o novo disco, a boa receptividade no festival francês Download, a cena em Natal e a apresentação em Salvador, conversamos com Emmily Barreto, vocalista e uma das compositoras da banda, um desses bons nomes do atual rock nacional.
Vocês são de Natal, uma cidade hoje com muita relevância no cenário musical, mas que antes era quase invisível no cenário musical. Para vocês, a que se deve esse mudança e essa cena tão rica na cidade?
Natal tem um cenário musical muito massa. É bem plural, bem diverso, tem bandas bem diferentes entre si. Mas não faz pouco tempo não. Acho que é uma coisa que vem se desenvolvendo de uns 10 anos para cá, se não mais. Eu pelo menos estou há uns 10 anos no rock em Natal, os meninos também. Lá tem um combo cultural que se chama DoSol que tem estúdio, tem bar de rock e no final do ano tem o festival. Um festival muito bom e as bandas prestigiam bastante, as bandas da cidade, e isso ao longo do tempo fez com que as pessoas se empolgassem para criar bandas, fazer coisas e para tocar no festival DoSol no fim do ano. Então eu acho muito massa Natal por isso. E também porque todo mundo se conhece lá do do rock. Então todas as bandas estão no mesmo rolê, não tem divisão por nicho de gênero musical, todo mundo toca junto, faz rolê junto e isso é muito massa porque também contribui para abrir a cabeça das pessoas musicalmente, né? E o público de lá é bastante acostumado com isso. O Rafael tocava numa banda chamada Calistoga, que era de pós-Hardcore, e eu tocava na Talma & Gadelha, que era uma banda de pop, e as mesmas pessoas que iam para o show do Calistoga iam pro show do Talma & Gadelha. E as mesmas pessoas que tocam no Calistoga e no Talma & Gadelha pode formar o Far From Alaska, isso é uma coisa que só em Natal é possível. A gente brinca que se fosse aqui em São Paulo, se a gente morasse aqui desde o começo, o ar From Alaska nunca teria existido, porque a gente nunca tocaria junto. Aqui é muito mais gente, é tudo muito mais separado.
Sei que devem ter respondido várias vezes, mas sempre perguntam isso. No momento em que a música brasileira ganha força, vocês fazem rock e cantam em inglês. Há alguma razão especial, vocês miram o mercado internacional?
Sobre a gente cantar inglês, essa pergunta na verdade tem bastante relação com a pergunta de cima, que é sobre Natal. Em Natal, a gente está na esquina do Brasil, fazendo rock, fazendo bandas, e quando as pessoas vão começar a bandas lá, elas não pensam muito nisso, não pensam muito em “ah vou fazer uma banda para fazer sucesso”. É até engraçado ler isso de ‘vocês miram o mercado internacional’. Se você soubesse onde a gente veio, como nossa história começou, você veria que a gente não planejou nada disso, a gente não pensou em nada disso. A gente faz em inglês porque é o jeito que a gente gosta de fazer, é o jeito que a gente acha que faz melhor. A gente tem dificuldade de escrever letra em português, as emoções fica um pouco mais mascarados em inglês e a gente escuta muita banda de fora também e é meio que isso. Não tem nada especial a respeito. Mas vale a observação de que essa pergunta a gente só começou a ouvir quando a gente veio para cá (São Paulo). Por que aqui, por ser um grande centro, e o eixo São Paulo-Rio, e as pessoas querem fazer sucesso e ganhar dinheiro e aí elas vão fazer uma banda e elas pensam em como atingir mais pessoas. Essas questões ganham uma relevância que para a gente não tem. A gente simplesmente faz do jeito que gosta mesmo e eu acho que todo mundo deveria fazer a mesma coisa. Não importa a língua, não importa nada, importa você estar fazendo o que você quer, do jeito que você quer. Mas agora, depois de tudo isso ter acontecido com a nossa vida de banda, sim, estamos começando a dar os primeiros passos internacionais e que sorte que a gente canta em inglês, né? Mas não foi nada programado.
Vocês foram bastante elogiados no Download festival na França, que teve nomes como System Of A Down, Linkin Park e Green Day. Como foi esse show e a experiência no exterior?
O Download Festival foi I-RA-DÍ-SSI-MO na França. A gente não esperava a quantidade de pessoas. Tinha umas 30 mil pessoas na hora do nosso show. É uma galera que tem uma vibe um pouco diferente daqui que a gente percebeu, tratando de festival grande. Por exemplo: meio dia e meia abre os portões, meio-dia e trinta e um tinha 20 mil pessoas. Uma da tarde tinha 30 mil pessoas. As pessoas chegam cedo, as pessoas querem ver todas as bandas, elas estão lá entregues para ver seu show. Para a gente foi muito muito muito massa isso. A galera pirou, foi massa. A gente se sentiu até meio famoso. A galera vinha tirar foto com a gente depois. E era a primeira vez que tinha visto. A galera participando do show. Foi irado. Acho que vale o exemplo da galera chegar cedo nos festivais. A gente vê os festivais maiores aqui, tipo Lolla, tipo Rock in Rio, é pouca gente que chega cedo, as pessoas chegam 4h30 da tarde. Foi massa ver isso lá. A gente não estava esperando, a gente é acostumado com isso, né? A gente não tava esperando essa quantidade de gente, não estava esperando essa interação do público, essa loucura que foi. E aí foi massa porque rendeu também uns reviews de algumas revistas importantes, tipo a Kerrang!, que é uma das maiores revistas de rock da Inglaterra, matéria no Le Figaro, foi acima de qualquer expectativa da gente
O que o novo disco tem de diferença para o trabalho anterior? Qual foi o processo de criação e produção dele?
Esse novo disco, em relação ao anterior, ele é bastante diferente. Falando bem particularmente, eu consegui corrigir algumas coisas que me incomodavam muito no “modeHuman”. Depois que a gente lançou, e depois que a gente foi tendo outras vivências musicais, percebemos que é um disco com umas melodias que não são tão legais de cantar junto. E isso foi uma coisa que a gente percebeu na raça, a gente tocando. As pessoas curtem Far From Alaska, vão para o show querendo cantar, mas são poucas as músicas que dá para cantar junto. A gente sentia falta disso, então foi algo que eu me preocupei bastante na hora de compor as melodias. E outra coisa também que me incomodava muito no primeiro disco, é que a gente tem essa característica muito forte de riffs e isso é muito massa. Só que no “modeHuman” ele toma uma importância que acaba comendo a música inteira. As músicas do “modeHuman” são riffs loopados para sempre, não tem muita harmonia, não tem muita progressão de acorde. Esse segundo disco foi pensado para ser mais harmonioso mesmo, para ter mais melodias boas de cantar, para ter uma progressão de acordes para as pessoas tocarem no violão também. Se está na rodinha de amigos no luau vai tocar músicas do Far From Alaska. Agora dá para fazer isso, antes não dava.
E também eu acho que é um disco mais leve, mais solto, com mais cor, mais iluminado, a gente está muito mais à vontade para ser quem a gente é. Quando começaram a sair matérias da gente na mídia e tudo mais, as pessoas tratavam a gente com banda de stoner rock e aquela coisa do roqueiro malvado, camisa preta, isso não tem muito a ver com a gente. Até a gente das fotos divulgação também não ajudavam muito nesse sentido. Então a gente acabou passando uma imagem de uma coisa que a gente não era. Meio sem querer, por falta de experiência, por falta de segurança, nem sei te nomear quais os motivos, mas a gente meio que passava uma coisa que a gente não era assim, essa coisa malzona, sisuda do rock, e a gente não é assim. A gente é meio abestalhado, a gente ri de besteira, a gente é mais bem humorado do que o “modeHuman”, acho que essa é a palavra. O “Unlikely” é bem mais bem humorado e bem mais a nossa cara também.
O processo de criação desse disco foi um pouco diferente. Antes a gente ia pro estúdio em cinco e fazia as músicas todos juntos, encaixando pedaços e tudo mais. Esse disco a gente fez muita coisa em casa, no violão. Muito por isso, muito por essa preocupação que a gente tava com melodias e acordes tal. A gente fez muita coisa no violão e montamos junto no estúdio, cada um fazendo sua contribuição. Eu acho que o fato da gente ter feito ele mais em casa, eu, Laura e Rafael, a gente mora junto, aí várias ideias surgiram no violão. Isso fica presente disco exatamente pelo lance de serem músicas boas de tocar no violão também.
O que o público pode esperar do primeiro show de vocês em Salvador, no Radioca?
Poxa Salvador finalmente a gente tá muito ansioso para ir para Salvador a gente chegou tocar na Bahia acho que no ano passado ou ano retrasado, mas não tocou em Salvador. Eu nem conheço a cidade ainda, mas estou muito afim de conhecer. E o show, vocês podem esperar caos e quebradeira, chute na porta e um som muito alto. Espero pelo menos cinco pessoas dançando loucamente em cima do palco. E espero que isso contagie todo mundo e todo mundo dance e cante com a gente, porque tá muito divertido esse novo show, tá muito para cima e a gente tá como nunca empolgados para fazer. Então espero ver todo mundo lá.
Ouça duas músicas do novo disco “Unlikely”