O ano foi de veteranos nomes da música darem as caras com grandes discos. Alguns, só mantendo a regularidade de lançamentos periódicos, outros, ressurgindo depois de alguns anos sem novidades ou trabalhos inéditos. O melhor é que, mesmo com a idade já avançada, boa parte destes já ultrapassando os 70 anos, gravaram discos bastante interessantes. Praticamente todos tiveram seus discos em listas de melhores do ano. Entre os lançamentos, tivemos Leonard Cohen, o mais velho da turma, com 78 anos, lançando “Old Ideias”; Scottt Walker com o estranho, experimental e provocante “Bish Bosch”, uma ópera apocalíptica; Paul McCartney com “Kisses On The Bottom”, um álbum de canções americanas que o marcaram na infância, standarts dos anos 30-40; e Patty Smith de volta com o grande disco “Banga”, um álbum de inéditas depois de 8 anos, misturando rock, folk e blues e repleta de referências e com sua verve literária em dia.
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Neil Young mostrou que continua em alta produção e lançou dois discos. O não tão bem recebido pela crítica, “Americana”, com covers de clássicos do folk norte-americano, e o ótimo “Psychedelic Pill”, com apenas nove músicas, sendo três com mais de 15 minutos de duração e uma com mais de 27 minutos. Ambos os discos marcaram o retorno de Young ao lado da banda Crazy Horse. O bardo Bob Dylan nem é dos que ficam tanto tempo sem gravar. O último disco de canções originais tem apenas três anos. Em 2012, aos 71 anos, ele voltou com o ótimo “Tempest”, o 35º álbum da carreira. Nele, Dylan faz o que sempre soube fazer bem, belas canções que passeiam por folk, blues e rock para contar história de amor e de tragédias.
Comemorando os 50 anos de carreira, uma das bandas mais importantes do mundo, The Beach Boys, voltou em 2012 com um novo disco, “That’s Why God Made the Radio”. É o primeiro depois de mais de 16 anos sem gravar um disco exclusivo de canções inéditas e marca a volta de Brian Wilson, que produz, canta, toca e compõe a maior parte das músicas. A banda não mostrou nesse álbum nenhum tipo de evolução ou atualização, é praticamente o mesmo Beach Boys das décadas que passaram, com seu clima ensolarado nas melodias, letras por vezes reflexivas e os famosos coros de falsetes masculinos. Com reflexões sobre a passagem do tempo, mortalidade e fim da vida, a banda mostra estar ciente do estágio em que se encontra na história, e, mesmo não dando um passo além, comprova que ainda faz seu básico num nível bastante respeitável.
O soulman Bobby Womack não se conformou com a fama do passado e, depois de gravar com o Gorilazz, preferiu continuar o diálogo com gerações mais novas e sair da zona de conforto. Aos 68 anos, se juntou a Damon Albarn (Blur) e Richard Russell e lançou o belo “The Bravest Man in the Universe”, primeiro de inéditas depois de 13 anos. Ao lado do próprio Womack, Albarn, Russel e Harold Payne compuseram boa parte das faixas do disco, um trabalho de alto nível que trouxe de volta uma lenda na música negra americana e a apresenta renovada para as gerações atuais. Outro veterano que lançou um trabalho bem acima da média foi Bruce Springsteen. “Wrecking Ball” é uma das críticas mais contundentes ao modo de vida americano nos últimos anos. Nele, Bruce veste a pele de personagens do cotidiano para mostrar a realidade dos Estados Unidos em contraponto ao propagado sonho americano. A base de rock, folk e gospel, aos 63 anos, ele mantém algumas de suas marcas para fazer um grande disco: a voz grave e rouca, a produção caprichada e aquele clima de redenção para todo mundo cantar junto com alma e em coro.
O reggaeman Jimmy Cliff passou 8 anos sem lançar um álbum novo e muito mais tempo sem soltar um disco tão interessante quanto “Rebirth”. Este é mais um álbum de 2012 com um veterano contando com a participação decisiva de um artista mais jovem. Neste caso é Tim Armstrong, vocalista e guitarrista da banda Rancid, que é responsável pela produção e parceiro em parte das músicas. Ele não tira Cliff do reggae tradicional que ele já fazia, mas o faz aproximar de uma timbragem mais atual, uma sonoridade mais moderna, e abre espaço para que o cantor explore suas qualidades. Não é apenas um bom disco de reggae. A sonoridade tão caracteristicamente jamaicana e as letras politizadas permanecem, o vocal verdadeiro de Cliff também, mas no disco o reggae ganha um frescor, um clima menos viajandão e paloso, mais direto, sem parecer uma atualização na marra. Além de ter versões caprichadas de “Ruby Solo” do Rancid, e de Guns of Brixton, do Clash.
A grande boa surpresa foi Dr John, do alto de seus 72 anos soltou “Locked Down”, seu 29° disco e um dos melhores do ano, com produção caprichada de Dan Auerbach, da banda Black Keys. O álbum traz o cantor e compositor oriundo do mundo do blues se enveredando por terrenos menos rígidos e exorcizando seus infernos. Mais um que, com a influência de uma mente mais nova, aceitou mergulhar em rumos desconhecidos e fazer algo diferente do que já havia feito antes, com novos timbres e novos ritmos. Dan Auerbach apresentou a música do etíope Mulatu Astatke, que foi marcante na sonoridade do álbum, assim como sugeriu um orgão funkeado no lugar do tradicional piano. “Locked Down” é um misto de rock, R&B, funk e afrobeat que aprofunda as dores e cores de Nova Orleans, terra natal de John.
O veteranos no Brasil
Pelo Brasil, apesar da data festiva de 70 anos para vários grandes nomes de nossa música, Gilberto Gil, Milton Nascimento, Paulinho da Viola e Caetano Veloso, apenas o último lançou um novo trabalho. Caetano Veloso soltou mais um disco que dividiu as críticas. “Abraçaço”, terceiro CD do baiano com a banda Cê (Pedro Sá, Ricardo Dias Gomes e Marcelo Callado), recebeu duras críticas de um lado e elogios rasgados de outro, chegando a figurar em diversas listas de melhores do ano, entre elas da revista Rolling Stone, para a qual foi considerado o melhor disco do ano. Apesar de estar longe de ser o melhor trabalho do cantor e compositor, o disco mostra o quanto Caetano ainda pode ser provocador e mexer com o mundo a sua volta. Soando moderno, às vezes até forçando a dose para tanto, é capaz de falar de bossa nova e listar lutadores de MMA numa mesma música, de fazer belas canções como “Estou Triste” e de cometer bobagens como “Funk Melódico” e “Parabéns”. Aos 70 anos, ele ainda faz diferença
Um outro tropicalista, Tom Zé, também costuma lançar trabalhos cheios de provocações e ideias contemporâneas mesmo com mais de sete década nas costas. Em “Tropicália Lixo Lógico” ele volta com um disco quase todo conceitual, falando das origens do Tropicalismo. Com convidados da nova geração, Rodrigo Amarante, Washington, Pélico, Mallu Magalhães e Emicida, o baiano de Irará faz seu melhor disco dos últimos anos. Uma sonoridade que soa atual e bem tramada, que envolve samba, rock, samba enredo, marchinhas, cordel, bossa, rap e a nova música popular brasileira. A invenções sonoras, os andamentos às vezes estranhos, os temas que ninguém aborda e os sons inusitados estão lá, tudo da forma que só Tom Zé é capaz de mexer. É outro veterano que continua em forma.